Um quadro de Munch trazido à vida, Natalie Mering tem contornos de óleo sobre tela. Pétrea no sorriso, graciosa no toque. Decalcada de outro espaço e momento que não o Bairro Alto. Que não 2015. Entoa poesias tenras que nos chegam amareladas de tempo, como todas as cartas e versos que não rasgamos.
A sua época é esta, disse-nos. As suas canções de um agora imediato que lhe reconhecemos – “I Thought You Were The One”, escrita na digestão de “The Innocents”, fala-nos de um passaporte roubado em Hamburgo -, mas cinzeladas pelo escultor absoluto. Olhamo-la só, pela penumbra de uma Zé dos Bois que se refugia da babel lisboeta.
A taça de vinho como cão de guarda, o teclado como trace italienne entre ela e as invasões que pressentimos ao longe: faróis incandescentes, risos espásticos, explosões soterradas por explosões maiores ainda, ânsias de intimidade, copos que tombam vertendo o vazio. Calçadas que nos dedos cheiram a tabaco e na boca mastigam a ressaca. E ela, ali, sozinha, abençoada pelo tempo que não precisamos. Num bálsamo uterino feito palco, feito silêncio.
Sentimo-la Sibylle Baier na guitarra, entrevemos Lisa Gerrard ao teclado como um ténue querubim que declama “Some Winters”. A ebúrnea silhueta que despoja “Everybody’s Talkin” da sua virilidade “Midnight Cowboy” para lhe vestir a inquietação da fuga para não voltar. Foi Weyes Blood.