Seguida em palco também pelo seu “parente” de longa data Nate Brenner no baixo, a mistura entre o electrónico e o tribal resultou, excepto quando o ukelele entrou no jogo para um momento mais pacífico e pouco condizente com o frenesim da maior parte das músicas que fizeram parte do alinhamento. Por aqui: aposta ganha.
Voltando a falar de esforços, os King Gizzard & The Lizard Wizard valeram todos eles e, se a distância entre o Coliseu e a garagem da EPAL tivesse sido percorrida ao pé-coxinho, certamente teria valido a pena. Sem serem geniais, nem carregarem com eles a bagagem da criação de algo nunca antes ouvido, conseguiram ser extremamente eficazes numa sessão dejam contínuo, alicerçado por duas baterias que, mesmo tocando ao mesmo ritmo, conseguiram dar espaço a toda aquela dose de efeitos e psicadelismo.
Este alargado colectivo, abraçado pela editora do senhor dos Thee Oh Sees, John Dwyer, proporcionou aquela ideia de que, mesmo que tudo estivesse fora do seu lugar, a descarga de energia foi tal que, dificilmente, se tornaria perceptível em malhas como “Hot Water”, “I’m In Your Mind” ou a versão contrária “I’m Not In Your Mind”. Ebulição constante com a ameaça de derramação permanente, muitas vezes a abraçar o improviso, os King Gizzard & The Lizard Wizard deram o concerto estouro do Mexefest.
Sentido inverso novamente para acolher St. Vincent. Acolhimento esse cada vez mais difícil, com os últimos discos que recolhem uma crescente e indisfarçável presença dos sintetizadores. Fruto da acústica ou de mera opção, muitas vezes a guitarra de Anne Clark esteve ausente – “Regret”, e mesmo “Birth In Reserve”, soaram desprovidas do instrumento – e abafada pela bateria, contrariamente aos seus discursos que pareceram mais do que nunca presentes.
Se o registo homónimo acompanha a sua perda de inocência e direcção à maturidade, também o seu som apareceu cada vez mais preenchido, a par da sua posse mais dominante. De facto, todo o espectáculo gira em torno de Clark, quer pelos passos estudados ou pela maneira como se arrastou e esfregou na pirâmide que adornava o palco durante “Prince Johnny”. Pegando nesta faceta, infelizmente, tudo soou muito mecanizado e pouco espontâneo. Quer os discursos, quer a forma como se jogou no público em “Your Lips Are Red”, a forma como se moveu, tudo pareceu surgir de trabalho prévio e tornou St. Vincent e, acima de tudo a sua música, demasiado segura e pouco dada a lapsos e devaneios realmente fruto do momento.
O segundo dia do Mexefest começou no São Jorge, com os Adult Jazz – que raio de nome, rapazes – e, quem possa ter ido ao desconhecido, encontrou uma designação nada condizente com a música que praticaram. Registe-se o trombone que permite dar alguma luz a um som amorfo, chato e a lembrar vocalmente James Blake, mesmo que para isso este trio tenha utilizado um conjunto largo de efeitos vocais. Roçando o minimal em algumas partículas, deles não viverá a memória do certame.
Descida da Avenida da Liberdade para presenciar um daqueles casos de amor à primeira audição. Quem a viu na apresentação do magnífico “Tramp”- disco que, desta feita, praticamente não se escutou – na sala do Lux, podia temer pelo seu comportamento perante uma plateia de alguns milhares de almas. A timidez deSharon Van Etten parece estar cada vez mais ao de leve e “Affraid Of Nothing” ou “Taking Chances” serviram para nos balançar na sua direcção. Sem discursos pensados e respondendo de forma bem-disposta a todos os comentários a roçar a anormalidade que, por vezes, saíam da plateia, respondeu com “Save Yourself”.
Cada concerto de Sharon serve para o estabelecimento de uma relação provisória, não só pela pureza e beleza dos seus temas, mas também porque se sentiu que a cada palavra que entoou, nos revelava o seu íntimo e nos tomava para a sua privacidade em “Break Me” ou “Your Love Is Killing Me”. A promover o seu mais recente trabalho de estúdio “Are We There”, foi deste que saiu quase todo o embalo, a fragilidade e a tranquilidade. Apesar disso, o recurso ao passado com “Give Out”, mostrou o grande conforto e harmonia que transparece da sua presença e voz. Volta sempre.
Mudança de ritmo e, depois da acústica de Sharon Van Etten, a curta distância entre o Coliseu e o ginásio do Ateneu Comercial de Lisboa, era preenchida pela fila para aceder à rockalhada dosCloud Nothings. Concerto esgotado. Num cenário com marcações e tabelas de basquetebol, o rock do trio recordou uma banda universitária a tocar num baile. Mas, atenção, os americanos tocam para graúdos e gostam do barulho, aqui acentuado por uma acústica a preparar caminho para o ruído e feedback que não se escuta tão facilmente em vários momentos lo-fi de “Here And Nowhere Else”.
Com uma longa relação com Portugal, seja por já ter composto por cá, ou por ser uma presença frequente nas nossas salas, Jay-Jay Johanson não seria, certamente, música para acompanhar os belos e fartos petiscos que se servem na Casa do Alentejo. A sua música é quase cerimonial e deixa sempre a dúvida que o seu percurso musical também tem sugerido, uma vez que já abordou várias temáticas que vão desde a electrónica até à composição puramente vocal.
Com o sueco é sempre melhor não se tecer grandes ideias acerca daquilo que apresenta. Assim, pela sala repleta de espelhos, acabou por ressoar a sua melancólica e pausada voz, acompanhada apenas pelo órgão e por muitas estruturas sonoras previamente gravadas. Há algo de generoso e agradável na sua voz, ainda mais claro quando cantou sozinho ou sem microfone e, a majestosidade do candelabro que se erguia acima da sua cabeça, colidiu com a sua capacidade vocal.
Para receber os Wild Beasts, mais um banho de multidão. A avaliar pelas enchentes, será de supor mais uma bem-sucedida edição do Mexefest. Bem-sucedidos são cada vez mais os britânicos, apesar de o cansaço que norteia cada vez mais as suas composições acrescidas pelo acorde fácil e pela presunção do orelhudo. Se a cada novo disco parecem crescer em termos de notoriedade, continuamos a ter algum apreço pela estreia discográfica com “Limbo, Panto”. Desde aí, aquele indie (podemos dizer esta palavra sem o apedrejamento?) fácil, tem jogado pouco num campeonato cada vez mais cheio destas propostas.