Maria I decretou nove dias de luto e uma procissão de penitência por hóstias derramadas no chão. A moralidade judaico-cristã, a transgressão ante o desígnio divino, obriga-nos a dobrar a espinha sob o peso da culpa e talvez por isso nos algememos ao passado como mártires duplicados. Testemunhar Vashti Bunyan – plácida, bucólica, numa serenidade quase ameaçadora para os que têm a alma convulsa de desassossego -, recordando a juventude, sem fósforo de angústia, aperta-nos o estômago. As suas composições simples, desassombradas de grandes e pequenos males, de quem foi a tempo de corrigir erros e devaneios, são pequenos cartuchos sépia sobre uma vida feita repartida entre quotidianos acústicos: amores perdidos, um outro amor ganho, as viagens pelo countryside espalhadas numa janela de comboio, os filhos, os sonhos dos filhos, os seus sonhos que ficaram algures lá atrás. Resume-se tudo numa apostila de poucos acordes, evocados pela materialidade no Maria Matos com a ajuda sublime de Gareth Dickson. Foi puro e foi belo, com ovação.