Depois de um primeiro dia de claro sucesso, previa-se uma continuação do festival igualmente forte, e assim foi. Começaram os The Firstborn, sem dúvida um dos projectos nacionais mais interessantes que andam por aí. Adoptando uma estética sonora bastante avant-garde, de algum modo reminiscente de uns Emperor mais tardios (ou de um Ihsahn a solo, até), a banda de Amora faz perpassar um travo oriental pela sua música, criando uma atmosfera algo esotérica mas bastante potente. E após uns The Firstborn pouco comunicativos com o público e muito directos na abordagem ao seu set, seguiram-se uns Oblique Rain bem mais faladores, pecando talvez por excesso nesse particular, dada a duração discursiva entre músicas.

Mas mais palavra, menos palavra, os Oblique Rain são uma força emergente do progressivo em Portugal, como é documentado no seu último trabalho October Dawne no reconhecimento crescente que lhes é prestado pelo público, sendo que Vagos não foi excepção.

Em estreia por solo nacional, os finlandeses Ghost Brigade apresentaram o seu death melódico perpassado por temas de um sludge que teve tanto de rockeiro como de bastante melodioso. Aliás, talvez o carácter distinto entre os temas mais agressivos e o carácter mais melódico e introspectivo de outros temas possa ter sido um factor de divisão entre ouvintes mais ortodoxos, no entanto, o público correspondeu bem à proposta destes senhores.

Do death ao doom, do progressivo ao folk, foi de facto um morfismo musical aquilo que se seguiu. Igualmente finlandeses, mas donos de outro estatuto e carreira, os Amorphis eram à partida um dos pontos de maior interesse do festival. Os autores deTales from the Thousand Lakes e de Elegy percorreram praticamente toda a sua carreira, desde Sign from the North Side a Sky is Mine, do seu mais recente trabalho, Skyforger. Com uma actuação enérgica, que manteve a audiência sempre sintonizada, os Amorphis demonstraram a razão de serem uma banda tão influente.

Too over the top? Talvez para quem esteja habituado a sonoridades mais sujas e menos épicas, mas hey, power metal é mesmo assim, e isso é algo que os Kamelot dominam com mestria. Com uma actuação plena de teatralidade, os norte-americanos deram um recital sinfónico de bem tocar, onde não faltou nenhum dos condimentos que fizeram da banda uma das mais bem sucedidas no seu género, do aparato épico ao virtuosismo dos seus intérpretes. E com temas como Ghost Opera,Forever ou Rule the World, a fórmula provou ser de sucesso, colhendo a respectiva forte ovação do público durante todo o concerto.

Ausentes dos palcos nacionais durante 16 anos, por força do fim abrupto da banda a meio da década de 90, os Carcass eram outra das presenças mais aguardadas. Uma expectativa claramente justificada pela influência duradoura de uma banda seminal tanto para o grindcore, como para o death técnico e melódico.

Abrindo com uma gravação de Asylum, tema controverso dos lendários Crass, os Carcass mostraram bem ao que vinham disparando Corporal Jigsore Quandary e Buried Dreams, mau grado alguns problemas técnicos, entretanto resolvidos. Apesar de terem visitado as diversas fases do seu repertório, o acento foi dado a Heartwork(mais de metade do álbum representado), que constitui provavelmente o disco onde a dupla Steer/Amott alcançou a sua mais equilibrada expressividade.

Jeff Walker e C.ª foram mais do que um pedaço de história viva num qualquer acesso nostálgico, deram isso sim um verdadeiro recital death/grind do melhor que já se fez, como que reclamando a paternidade de um género onde por vezes escasseia já a originalidade. Tal como em Meshuggah no dia anterior, não houve cansaço que resistisse ao ora-solas-tu-ora-solo-eu de Bill Steer e Michael Amott, à impecabilidade da interpretação de Daniel Erlandsson do trabalho de um dos mais conceituados bateristas de death (já lá vamos…), e à força e crueza da voz de Jeff Walker, sempre bem disposto e comunicativo, como que criando um ambiente de familiaridade com um público que não lhes regateou aplausos e apoio.

Duas notas ainda: a primeira humorística, e tem que ver com o inenarrável roadie “cookies are good, chocolate is better” no soundcheck (é só ir ver ao YouTube…), a segunda afectiva, com a presença em palco de Ken Owen, que tem marcado presença em palco em algumas das actuações da banda por essa Europa fora. Foi um momento de comunhão entre a banda e o público, com Walker a apresentar um a um os elementos do colectivo de Liverpool, até à surpresa Owen. Uma actuação inesquecível, e que traz já saudades.

Terminou assim o Vagos Open Air 2010, que se assume já como a grande referência dos festivais de metal em Portugal. Para o ano há mais, esperemos que com igual intensidade.