Torche pegou fogo a um Santiago Alquimista que os preferiu ver de cima para baixo. E isso não representou um obstáculo para eles. Abastecidos pelo combustível dos amplificadores Orange, o trio de Miami conseguiu fustigar, até, os muitos que se deixaram ficar pelo primeiro andar.

Ainda antes disso, os Men Eater pegaram na tesoura e cortaram a fita de inauguração de uma noite dedicada ao sludge. E, para estrea-la, nada melhor do que aproveitar a deixa e despejar uma música também ela debutante, pertencente ao novo disco da banda, que está prestes a ser lançado. Talvez por ainda estar em modo embrionário, ou por ter sido afectada por um som atabalhoado (que foi melhorando progressivamente), o efeito causado não foi o melhor. Ninguém se importou por aí além, até porque logo de seguida surgiu o riff de Man Hates Space, cujo refrão foi entoado pelas dezenas de pessoas presentes. As groovies Black e Drunk Flies Drugged Souls espicaçaram um público já de “mood” feito, que se deixou levar definitivamente pela já clássica Lisboa, tocada no coração da cidade que lhe dá nome. E, de peito cheio, com o baixista Gaza cambaleante, Men Eater partiu para um final à Vendaval, patrocinado pelos riffs de Heartbeating Locomotiva e Last SeasonMike agradeceu à malta por preferir abanar a cabeça a compasso, em detrimento do futebol, e pediu um aplauso para os Torche, que, certamente já aqueciam os músculos no backstage.

Assim que entraram, os americanos pediram aos presentes para galgarem o degrau de madeira, aproximando-se o mais possível da banda. Assim foi, o que fez com muitos optassem por ver a banda do primeiro andar, já que não deve ser fácil ficar atrás de uma plateia da altura de uma equipa de basquetebol.
Trocados os primeiros sorrisos, Torche entrou com toda a pujança com Piranha, do álbum Meanderthal (2008), cuspida com a mesma saliva de Sandstorm, a faixa que se seguiu. Bastaram (quase) quatro minutos para se perceber que, apesar da simpatia e visível satisfação dos membros da banda, eles não estavam ali para tocar o lado melancólico de quem foi até ao Santiago Alquimista. Pelo contrário. U.F.O. eArrowhead, englobadas no EP Songs for Singles (2010), funcionaram como injecções de uma qualquer substância estimulante, não dando grande espaço para respirar de alívio e servindo como mote para a descarga sludge-punkish que já se escarrapachava diante de todos.

Com pausas apenas para afinar os instrumentos, Torche invadiu a sua própria discografia, sacando do baú músicas como Safe e Mentor, do álbum homónimo de estreia (2005), que serviram de pretexto para que Steve Brooks e Jon Nunez entrassem plateia adentro, rindo e dançando em plena sintonia com aqueles que os aplaudiam e saudavam. Regressados à base entretanto, os dois músicos, aliados a um baterista (Rick Smith) esmagador – que o diga o drumkit  –, decidiram tocar o resto de Songs for Singles de rajada, EP que foi exposto na íntegra a quem lá esteve para o ouvir. De destacar Out Again, que, se já é óptima no EP, ao vivo fica deliciosa.
A “thunder pop”, definição aplicada por Steve Brooks à sonoridade dos Torche, transformou-se num vil doom já perto do final do set, quando os americanos decidiram pegaram no EP In Return (2007) para aplicar um duplo e rude golpe low-tuned com Charge of the Brown Recluse e Tarpit Carnivore. Provavelmente, o melhor momento de toda a noite, algo comprovado por Rick Smith, que se levantava para explodir toda a sua intensidade na bateria. Assim que o feedback sossegou , levantaram-se as palmas e os pedidos para que a banda não fosse já para o Porto.

E não foram, não. Depressa voltaram para o palco, perguntando ao público o que queriam ouvir. Healer, ora pois!  Quiçá a faixa mais conhecida do grupo, Healer foi reproduzida com sal e pimenta, condimentando um encore que contou, também, comAcross the Shields e Without a Sound. Mas não só… Quando a banda já se preparava definitivamente para embarcar rumo ao norte, os cânticos “we want more” fizeram com que os três músicos decidissem tocar ainda mais uma track. Já de boina posta, como quem se prepara para sair de casa, Steve Brooks admitiu que eles estavam com um espírito perfeito para o concerto e que, por isso, iriam aceder aos pedidos ruidosos do público. King Beef, do split com os japoneses Boris,  marcou a despedidade Lisboa com um “let’s party”, bem acompanhados pelo vinho português, agarrado à mão de Brooks. Pousada a guitarra, o baixo e as baquetas, os músicos vaguearam pelo Santiago Alquimista, conversando com aqueles que se lhes dirigiam.

Curto em duração, mas verdadeiramente intenso, o concerto de Torche ficará registado como um dos momentos-topo do ano de 2010. As gentes do Porto que se preparem, porque hoje é a vossa vez!