Tem-se mais ou menos a certeza de que o MF Doom muitas vezes não está para se maçar com isso dos concertos ao vivo. E, esperto que nem um alho, refugia-se na máscara de gladiador para enviar sósias de substituição – uns mais magros, outros mais gordos, uns que vão pelo playback, outros que mordem a língua até lhe chegarem aos calcanhares do flow. É uma coisa que se faz, é uma coisa que se repete. Ética ou com falta dela, o máximo que pode acontecer a quem mete os pés num concerto de MF Doom é voltar para a casa a pensar: «será que era mesmo o gajo?».
Nós voltámos do Maria Matos com outra dúvida: «será que o gajo estava mesmo lá?». É uma dúvida legítima. Ninguém o viu. Não houve doppelgänger, fotocópia, um irmão gémeo escrito à pressa pelo Tozé Martinho. Podemos até inventar rumores: seria o Burial? Fumo havia. Montes de fumo. Daquele que não desperta alarmes, mas que seca os olhos. Daquele que não tira os sapadores do quartel, mas que deixa os sebastianistas com pruridos e titilações orgásticas. Esse “Silent Hill” resvés Praça do Areeiro foi para nos meter em sentido, logo de entrada, como quem insinua: «ai, ui, cuidado, vai haver aqui algo muito artístico». O pós-pós-moderno da desmultiplicação electrónica, o seventh sense em que a figura humana é subtraída por duas cores: rosa e azul. “Love Streams”. E é suposto ter significado. Claro que tem significado. Se ele não aparece é porque nos quer transmitir algo.
Pois quer. Mas o Tim Hecker não é o James Joyce. É um tipo que faz música. Vive disso. E nós, que não vivemos, não temos de andar atrás dele para lhe aparar os intuitos. Nós, banais assalariados, se calhar não temos lá muita paciência para numa terça-feira à noite, depois de um dia de trabalho, ainda ter de fingir cenários, puxar pela imaginação e fazer de conta que está o que não se vê, que se sente o que não existe. Foi frouxo, mole. Havia gente a dormir. E não que seja impossível colocar-se as fichinhas todas no aspecto cénico, conjugando-o com o atropelo sonoro, sem cair na mais chata platitude – vimo-lo acontecer na mesma sala, ainda há pouco tempo. Dessa noite saímos em carne viva. Desta trouxemos remelas. Até a luz do Maria Matos cá fora, dos corredores às casas de banho, adormeceu. Mas o problema é capaz de ser nosso.