Depois de um dia cinzento, alternando entre muita ou pouca chuva, o Teatro Maria de Matos encarou os Magnetic Fields como a banda que seria capaz de superar e mostrar que tal dia tinha salvação.

Imediatamente no momento em que o quinteto entra em palco, surge a sensação que a conquista prévia está garantida e, logo nos primeiros segundos de I Die, do longínquo I, após a voz de Stephin Merritt ecoar pela sala, se entende que só uma hecatombe poderia transformar o concerto em algo menos que magnífico.

Olhando para todos os elementos da banda e, especialmente para Merritt, era impossível não pensar no quanto parece uma figura frágil e diminuta por trás do harmónio. No entanto, a sua voz cedo mostrou o contrário, através da capacidade inigualável de tocar e abarcar para si toda a atenção. De facto, parece que não canta, mas sim que entoa a voz de forma falada, como se tivesse em pleno momento de conversação com o público.

Apesar de o regresso dos americanos a Portugal ter como conduta a apresentação de Love at the Bottom of the Sea, é de 69 Love Songs que foram apresentados mais temas e, quando se recordaNo One Will Ever Love You, Time Enough for Rocking When We’re Old ou até a pequenina Boa Constrictor, é facilmente entendível que tudo joga no seu devido local. Não só o piano de Claudia Gonson parecia encontrar os momentos e as teclas certas, como as cordas do violoncelo, da guitarra e do uquelele de, respectivamente, Sam Davol, John Woo e Shirley Simms, se assemelhavam a estradas sonoras com poucos ou quase nenhuns desvios. A magnitude do acústico, da canção e da harmonia, tornaram-se, portanto, os expoentes máximos ao longo dos 27 temas apresentados.

Por outro lado, a grande virtude, que os Magnetic Fields foram capazes de traduzir ao vivo, exprimiu-se na forma como os temas do mais recente disco foram encarados. Esquecendo os sintetizadores, mostraram que estas mesmas faixas têm ao vivo uma nova e distinta faceta, soando mais simples e sem a interferência desnecessária de elementos que fujam ao carácter do acústico, fazendo imaginar o que poderia ser o disco se baseado nesta concepção, tal como ficou demonstrado em Goin’ to the Country.

Extremamente comunicativos, bem-dispostos e com uma incrível coesão de palco, os naturais de Boston foram capazes de arrancar sorrisos nas caras dos presentes. Assim, era interessante passar os olhos pela sala e verificar a quantidade de expressões felizes que iam surgindo ao longo da actuação. No fundo, manifestações de contentamento e de completa subjugação ao que ia acontecendo. Os Magnetic Fields fizeram por merecer essa total entrega.

Aproveitando a oportunidade, não foi esquecido o último registo deStephin Merritt, Obscurities, e Plant White Roses tornou-se um momento delicioso em que o grave e o agudo vocal do próprio e de Shirley Simms se sobrepunham e, juntamente, tornavam a música num incrível momento de toque.

Até ao final, Distortion não foi esquecido através de Drive on Drive, nem tão pouco o longa-duração anterior, Realism, com You Must Be Out of Your Mind. Curiosamente, The Charm of the Highway Strip, Holiday e mesmo Get Lost, também foram contemplados com apenas uma faixa.

Até ao momento de saída, com All My Little Words e Forever and a Day, as vozes e os sons que chegavam, pareciam não exercer tarefas circundantes, transmitindo as ideias directas a quem os ouvia, através de uma apropriação imediata e sem vicissitudes externas. Uma interacção sentida, benéfica e isenta de contornos negativos. Apesar de ser referido a faceta especialmente triste das letras da banda, aquilo que se apresentou foi, acima de tudo, belo