A roupa está ensopada em suor, o chão está peganhento e escorregadio, os ténis perderem a cor e o corpo, assim que arrefece, começa a ressentir-se das várias pancadas sofridas. Está concluída uma bruta noite de hardcore, onde os Terror, vencedores à partida (desta vez não foram “underdogs”), despoletaram uma onda de caos capaz de agitar as vizinhas águas do Tejo.
Muito antes disso, os Backtrack tiveram de encarar um Revolver ainda longe da sua lotação máxima, mas já com malta suficiente para oferecer um bom concerto. Vindos de Nova Iorque, estes rapazes que “pareciam ter quinze anos”, como disse alguém, distribuíram cerca de vinte minutos do clássico NYHC. Comunicativos e elogiosos para com Portugal, mencionando o bom clima e as belas mulheres, osBacktrack arrancaram os primeiros movimentos da plateia, que pouco ou nada conhecia do trabalho da banda formada em 2007. Apesar disso, cumpriram as suas funções, aproveitando um bom som (uma constante ao longo da noite) e receberam os devidos aplausos. Não seria, todavia, a última vez que visitariam o palco doRevolver. Mas já lá vamos…
De seguida, os Lionheart chegaram com o seu som carregado de atitude. Com uma temática claramente vocacionada para a superação pessoal, o Bay Area hardcore dosLionheart mostrou-se repleto de bounce e breakdowns, provocando esporádicos moves de slam dance na plateia. Sem contemplações, a banda distribuiu tanto músicas do seu fresquinho trabalho, Built On Struggle (2011), quanto faixas do aclamado The Will to Survive (2007). As pausas, essas, eram aproveitadas para pedir aplausos para os outros grupos do cartaz e para elogiar o público nacional. O final foi servido com This Is Who I Am, faixa rainha da curta carreira dos Lionheart, que levou vários dos presentes até ao microfone para entoar as palavras de ordem: This is who I am. This is where I’m from. Ain’t sorry for the shit that I’ve done.
Os First Blood assumiam-se como a grande banda de abertura, ainda antes de chegarem ao palco. Com quase dez anos de carreira, o grupo, também proveniente da Bay Area, teve uma recepção calorosa desde o primeiro acorde. Numa vertente straight edge/vegan (algo bem patente na camisola do vocalista), os First Blood serviram de mini-antecâmara para aquilo que viria a ser o tumulto chamado Terror: moshpits com fartura e movimentação amiúde à frente do stage. Faixas comoSuffocate, Silence is Betrayal e a violentamente felicitada Next Time I See You, You’re Dead fizeram parte de um alinhamento pujante, que teve como ponto altoSurvive – faixa com direito a um sing along potente. Um sólido gig de uma banda que já abriu concertos de Napalm Death e Cro-Mags, por exemplo.
O serão aproximava-se da meia-noite quando os Terror começaram a despejar todo o arsenal que era esperado, já com a casa a abarrotar. A entrada com Last of the Diehards marcou o ponto inicial de um concerto fustigante. Scott Vogel, envergando uma camisola de treino da selecção brasileira, tratou de imediato de pedir a demência total ao público: “Stage dives, stage dives, I wanna see stage dives!”. Pedido aceite, ou não estivessem os Terror a tocar Stick Tight do recente Keepers of the Faith (2010), logo seguida de Never Alone e da violenta One With the Underdogs, cantada por quase todos a uma só voz: Always against the odds! One with… The underdogs!
Não foi preciso muito para que Scott dissesse que, após nove anos de carreira, noites como a de Cacilhas davam o combustível para que os Terror prosseguissem o seu caminho. Visivelmente deliciado com a desordem provocada no Revolver e também admirado com os inúmeros corpos que se lançavam vez após vez do palco em direcção à plateia, Scott Vogel e os Terror trataram de continuar a oferecer porrada sonora de topo: Always the Hardway, Out of My Face e um presente especial, vindo directamente da demo de 2002, What Have We Done, mantiveram Cacilhas em polvorosa.
O old school dos Terror não se ficou por aqui. Aos que pediam Push It Away, doLowest of the Low (2003), Scott respondia que esta era a primeira tour em que não a tocavam. Mas, para compensar a desilusão, Better Off Without You e Don’t Need Your Help, também do primeiro álbum da banda, foram atiradas à cara dos que ali se encontravam. Resultado? Houve até quem se agarrasse ao candelabro da sala, no culminar da adrenalina provocada pelo punk hardcore do disco de estreia dos americanos.
Para arrasar definitivamente com o Revolver, os Terror cuspiram mais três faixas de One With The Underdogs (2004): Spit My Rage, Overcome e, na recta final, a míticaKeep Your Mouth Shut, que levou os membros dos Backtrack até ao palco para entoar as lyrics. Aproveitando a deixa, o baterista dos Terror cedeu o lugar ao comparsa de Backtrack e também ele se lançou em direcção à plateia, ao qual se junto alguém vindo directamente do balcão do recinto, para aplauso geral.
Referenciados como uma das grandes bandas de hardcore da última década, bem como um dos melhores grupos ao vivo dentro do estilo, os Terror confirmaram os seus predicados e deixaram o Revolver de pantanas, sem apelo nem agravo. Como diria o Scott: Quem esteve em Cacilhas, tal como ele, tinha um parafuso a menos. Ao olhar em retrospectiva para tudo o que sucedeu… Poucos duvidam disso.