Os engarrafamentos de gente eram mais densos no sábado, último dia de festival. Estavam inequivocamente mais pessoas que nos últimos dois dias, que sensivelmente terão recebido o mesmo número de público – com a balança a tender umas gramas paraBlur, ou talvez não. Só encontramos duas razões, que se complementam, tendo em conta que teoricamente os nomes que mais moviam emoções já tocaram: fim-de-semana, Parque das Nações; mas também – mudança de recinto, muitos convites à mistura.

Os espectáculos na água em frente ao supracitado Pavilhão de Portugal, e a sua pala, continuaram os três dias, à tarde e de noite. Hoje fazem coreografia com “Song 2”, mergulhando com owoowoooo; os pés agarrados à fly board, ligada por sua vez a uns tentáculos mecânicos, por onde passa energia impulsionada pelos corpos dos acrobatas, de fato de mergulho e capacete. Naquele ponto de passagem ao longo do rio, houve outro espetáccoiso… a acontecer durante todo o festival, com manobras de aliciação agressivas aos transeuntes que passam. Na tentativa de angariar duas almas, que se sentam frente a frente, e fazem o tão conhecido jogo do sério – com o pormenor que se farão a ambos as maiores macacadas para que alguém se descosa, incluindo pinturas.

Vimos a Márcia proporcionar um momento sunset no Palco EDP. Muita gente sentada à sombra da pala, imaginando gins com cardamomo e pepino, quiçá com zimbro e pimenta da Jamaica. Tempero é o que não existe nas cantigas da intérprete lisboeta. Vestida com um macaco calção branco, leve como a sua música. Ideal para um entardecer despreocupado com o refrão do caminho para o trabalho, ou da rádio lá de casa, que nunca mudará uma vírgula. Existe para passar e tudo ficar na mesma, tal como o sol se esconde e ergue.

Mais um pouco de molho inglês com os Palma Violets, ainda no EDP. Há sal e alguma pimenta neste baixo. Também umbackground electrizante, trazido da cena punk e garage rock britânica, que apela ao salto e à palma numa harmonia pop descontraída, de encaixe agradável, sem pretensiosismos. Mas faltam dez minutos para Rodrigo Amarante.

MEO Arena, aquela entrada tristonha, aquelas paredes de hospital, aquele balão de circo vazio. Desanimador ver Rodrigo Amarante ali sozinho, «os ingressos devem ser caros à bessa, tou meio solitário aqui», sorriu. Não nos podemos queixar do som naquele local durante todo o festival, mas ainda havia desconfiança para a solitária guitarra e para a voz imaculada do intérprete e compositor brasileiro. No entanto, largamente desfeita desde o princípio. Difícil foi concentrarmo-nos nisso: houve outros erros no alinhamento dos artistas pelos palcos, mas Rodrigo Amarante foi dos mais lesados, com a óbvia e larga legião de fãs de Crystal Fighters a conversar ininterruptamente, criando um burburinho que quase se sobrepunha às poucas vozes que o acompanhavam. Banda do Mar faria mais sentido ali naquele espaço de tempo, assim comoRodrigo Amarante perto do rio. Fomos espreitar os portuguesesD’Alva no Palco Antena 3.

E que festa por lá se passava, provavelmente com a maior enchente a que o redor daquele palco assistiu nos últimos três dias. Enfeitiçada pelas canções repletas de animação e lembranças de êxitos internacionais. Porém, daqui a nada são os Unknown Mortal Orchestra no EDP. Um dos nomes mais esperados deste dia fora do MEO Arena. Entraram em palco com as suas canções mais enérgicas. Apelando ao funk e ao garage da sua génese, esquecendo um pouco a corrente neo-soul/r’n’b que também lhes corre nas veias. Ao vivo, a voz de Ruban Nielson redescobre-se. É forte e voraz, até apetece perguntar o porquê dos muitos efeitos vocais utilizados em álbum.

De volta ao MEO Arena, e lá estão aqueles que estragaram “Irene”, “Fall Asleep” ou “Tardei”, aos saltos e aos uivos. «Do you want love?», pergunta o lead singer dos ingleses Crystal Fighters, sem camisa e com um tamulde na cabeça. Está tanta gente agora como nos últimos dias a assistir aos dois nomes maiores do cartaz. Êxtase sem contenções mostrados desde o princípio com “Solar System”, passando pelo super êxito “Love Natural”, sem qualquer quebra de emoção, na plateia e no palco.

O ambiente permaneceu para o que se seguia. Os Franz Ferdinand, com o seu novo projecto, que veio ressuscitar osSparks, banda inglesa esquecida no tempo. Julgávamos que os FFo tinham feito para ressuscitar também a sua carreira, auxiliando uma antiga glória, para no fim morrerem de novo todos juntos. No entanto, as cantigas que chegaram mesmo lá foram as já sabidas “Do You Want To”, “Walk Away” e mais ainda “Take Me Out”, bem mais perto da meta que “Piss Off”, que encerrou, e do outro singledo projecto “Police Encounters”, que lançaram no início. Quase nem seria de referir as músicas dos Sparks, desconhecidas quiçá até dos próprios FF.

A nossa objectiva foi excluída de Florence & The Machine, podem ver como foi no Instagram. Mas, antes de nos irmos, fomos espreitar o rapper brasileiro Criolo no Palco Carlsberg, à 00h30.

Muitas pessoas vão connosco, uma verdadeira debandada, na verdade. O que àquela hora nos faz pensar que também eles não verão os cabeças de cartaz de hoje – faltam apenas trinta minutos. Bom sinal para o espetáculo do músico brasileiro, que tem andado pela Europa a apresentar “Convoque Seu Buda”, editado em 2014, consensualmente elevado pela crítica. E o show que prepara não merece menos elogios, com uma banda que acrescenta muito ao que ouvimos no álbum, e não lhe retira nada: puro rap, cheio degroove e musicalidade. A presença é forte, típica dos MCs, mas com uma experiência que se revela desde logo – Criolo não chegou agora, há mais de dez anos que rima as favelas e os casos políticos à brasileira. A noite estava a tornar-se bem alegre e descontraída na Sala Tejo, e mais gente vai chegando. Imaginamos que assim tenha continuado noite fora.