Por esta altura, serão redutoras as lembranças de Peter Kembercomo um dos membros fundadores dos Spacemen 3. Mais de duas décadas desde a separação do colectivo, o britânico vem oferecendo as suas experiências musicais sob as mais variadas formulações. Seja através de Sonic Boom, Spectrum ou Experimental Audio Research, têm sido abrangentes as suas investigações. No Teatro Maria de Matos coexistiu a possibilidade de o visionar sob os vários epítetos.

No centro do enorme palco, o seu habitáculo, constituído pela sua mesa de trabalho e pelos monitores, parecia demasiado pequeno. Contudo, depois da sua chegada e do começo da sua versão de “Walking & Falling” de Laurie Anderson, ao mesmo tempo que iam sendo projectadas disformes e coloridas imagens, percebeu-se que estaria tudo adequado à sua estadia. Ao contrário daquilo que acontece no original e da grande parte das músicas da norte-americana, não foi a palavra a sobressair, mas sim todo o prolongamento e repetição exaustiva de cada partícula sonora, estando os sintetizadores empenhados em trazer a maior ambientalidade à estrutura do tema.

Prestando tributo aos Kraftwerk com “The Hall of Mirrors”, fez-nos embarcar no “Trans Europe Express”, trazendo uma versão ainda mais cósmica do mesmo, apesar de toda a exposição mínima de sons que a caracterizam. Assim, dando azo às suas pesquisas, Kember foi-nos brindando com as suas perspectivas experimentais muito centradas na vertente minimal da electrónica.

As formas geométricas que se projectavam na traseira da sua mesa, acabaram por transmitir alguma concordância com a geometria das suas malhas. O cuidado de definir com precisão as arestas para acertar com uma perfeita forma, sem que isso significasse uma construção espartana de adições de som, como se comprovou com o regresso à sua estreia discográfica com “Spectrum” através de “If I Should Die”.

Também os Suicide foram lembrados, e a versão mais longa de “Che” coincidiu com o endurecer da batida, do ritmo e dos ambientes mais dominantes e possessivos. Mostrando que estava disposto a perseguir vários momentos de todo o seu legado, Peter Kember reproduziu a sua visão actual de “Let Me Down Gently” dos Spacemen 3, dando mais pendor à sua drum machine e ao fervor hipnótico e subversivo dos sintetizadores e da voz.

“The End” foi levado à letra, marcando o término do contexto musical plural que foi testemunhado. Ao que consta, o músico de Rugby planeia longamente o seu próximo longa-duração. Faça-se um compêndio e estão lançadas as traves mestras.