A estreia de Sharon Van Etten em Portugal chega depois do lançamento de três discos de estúdio. No entanto, este momento acarreta um enorme trunfo, baseado no facto de Tramp ser um álbum majestoso de uma das grandes compositoras da actualidade.

Contudo, não foi apenas apoiado neste factor que residiu o sucesso da principiante em concertos no nosso país. A conjugação música, discurso e personalidade conferiram às suas composições e presença uma beleza pouco dada à superficialidade. A americana emana um registo singelo, por vezes parecendo quase frágil, que a torna encantadora. Como tal, no Lux não esteve apenas presente a sua música, mas também a simpatia, a simplicidade e uma arrebatadora timidez, o que conferiu uma conquista ainda mais facilitada.

Em palco sentiu-se que Sharon e a sua banda se encontram na melhor forma. Tudo corre na perfeição e, desta forma, a boa disposição e os sorrisos fáceis denotam esse factor, que acabam por ser transponíveis de forma preponderante para a forma como tocam. Assim, o ataque a ‘All I Can’, ‘Warsaw’ e ‘Save Yourself’ é feito de uma maneira natural e, desde cedo, se percebe que não se pode esperar uma banda com um sentimento latente de frete. Todos se disponibilizam para conquistar, notando-se prazer na voz de Sharon, e uma transmissão imediata para quem a ouve, não se coibindo de trocar constantes palavras com elementos do público.

Desta forma, quando em muitas ocasiões se discute se é ou não importante a comunhão do artista com a sua plateia, através da música, mas também através da comunicação extra musical,Sharon Van Etten demonstrou que sem essa característica o sucesso não teria sido tão largo. Da nascida em New Jersey comprovou-se a naturalidade, uma postura energética, a par de uma voz ora doce e terna, ora um pouco mais áspera, não se assinalando uma estrutura vocal linear, sendo esse um dos grandes louvores que lhe podem ser endereçados.

Jogando entre Epic e Tramp, tocados praticamente na íntegra, transpareceu a sensação de como é belo que alguém que canta sobre desencantos, consiga encantar; que alguém que explore a tristeza e os insucessos da vida, consiga conferir felicidade. Sharon Van Etten criou algo prodigioso: fazer com que as suas canções e a sua mensagem consigam despertar sentimentos contrastantes, um pouco à imagem da sua voz que caminha para lugares e tons tão díspares.

Depois de se encontrar sozinha em palco para a interpretação de ‘Solo’, o regresso da banda faz-se com ‘Don´t Do It’, sucedendo-se o percurso pelo último longa-duração, através de ‘Serpents’,’ Ask’ou ‘I´m Wrong’, nas quais a união de vozes com Heather Broderick se torna preponderante e primorosa, assistindo-se a uma troca de cadências e tons de voz opostos, mas totalmente integrados e nada dissonantes.

Antes do abandono e falhando o que estava delineado, acede ao pedido para um regresso a ‘One Day’, tema de Epic, encetando novamente a componente de tertúlia no seu espectáculo. A partilha da sua intimidade e da sua esfera pessoal é tão apaixonada que se torna difícil não se sentir um aconchego e uma apropriação dos seus dramas. Quando inquire se haveria espaço para mais dois temas, a verdade é que por todos os que estavam presentes, existiria disponibilidade para a ouvir por quanto mais tempo desejasse.