Os norte-americanos Secret Chiefs 3, na companhia do compatriota Wooden Wand, trouxeram um pouco do mundo até nós, directamente da América, algo que, aliás, é sempre obrigatório num concertos dos primeiros: proporcionar ao ouvinte uma alucinante viagem pelos trópicos, sempre centrados na Ásia, ao mesmo tempo que exploram os meridianos mais ocidentais, com as suas misturas perfeitas do intocável.

Antes de pisarem o estrado do novo espaço Vila Braga, subiram para a vista de todos James J. Toth e a sua guitarra, sob o nome de palco Wooden Wand. Com muito reverb e pouca gente perante o palco para navegar na sua onda, o norte-americano fez um esforço hercúleo para dar um grande concerto – e tê-lo-ia conseguido, não fosse um sem número de problemas que o transcendeu.

Contra ele não jogou, apenas, a apatia do público, antes pelo contrário. Esta foi totalmente derivativa de um espaço aberto, quase ao género de palco secundário de um pequeno festival, que punha James e as suas cordas distorcidas a quilómetros emocionais do público, uma distância que nem a sua boa vontade, simpatia e paciência conseguiram superar, não obstante o encore forçado, a pedido da organização e em nada alvo de crítica por parte da audiência.

Ainda assim, e com Servant to the Blues na calha, editado pela editora de Michael Gira, a Young God, Wooden Wand visitou o seu cancioneiro mais saudosista, mesmo como mandam as nossas tradições, e tocou o seu folk pejado de tristeza blues, passando porRolling One Sun Blues, Shame on you Texas e Scorpion Blue.

De problemas com a audiência não padeceram os Secret Chiefs 3. Deduzo que sejam afectados por imensas patologias, dado toda a insanidade, precisa e milimétrica, apesar de tudo, que corre nas veias da sua música, mas os problemas que a verdadeira globalização que a banda de Trey Spruance foram facilmente compreendidos pelas cerca de duas centenas de pessoas que de repente se plantaram em frente do palco, dada a recepção a que os norte-americanos tiveram direito.

Talvez tenham lucrado da vantagem de a sua música recorrer a diversas linguagens para se exprimir e de renegar a fala – e, por entre música árabe, death metal, alguns elementos de surf e, até, com recurso a bandas sonoras, que foram os elementos que osSecret Chiefs 3 trouxeram das suas sete bandas satélite, tudo ficou claro: era altura de festa e havia que partilhar da alegria que emanava do palco.

Claro que enquanto os mais melómanos se dedicavam a bater o pé, a fotografar ou a cabecear o ar, havia mesmo quem dançasse a mistura esquizofrénica de Spruance e da sua banda luxuosa – caramba, estamos a falar de cinco pessoas em palco, duas delas o mítico violinista dos Estradesphere, senhor dos arranjos de cordas em Grails e membro dos Master Musicians of Bukkake, Timb Harris, e o mentor de Kayo Dot e de maudlin of the Well, que se encarregou de manusear o baixo.

Acima de tudo, ficou claro que não importa com que banda se desloquem os Secret Chiefs 3. O cérebro mantém-se, mas os membros, apesar da mudança, têm sempre uma destreza única e, por isso, a execução é, também, muito especial. Quem assistiu à última passagem dos norte-americanos por Portugal, certamente mudou uma mudança drástica na sua formação e, consequentemente, no seu som. E ainda bem, porque continua imaculadamente contagiante. Haverá banda mais internacional do que uma que joga, em pé de igualdade, com elementos de culturas tão distintas e o faz soar bem? Não me parece; mas parece-me, sim, que tal só é possível graças às capacidades inegáveis de todos os seus membros.

Nos regressos, apontados para o Milhões de Festa e para o Festival Músicas do Mundo de Sines, nós lá estaremos. A banda prometeu que serão concertos diferentes. Mas isso são sempre, felizmente.