Visão insólita, simultâneamente agradável, o bairro alto deserto e de calçadas brilhantes (salvo as escorregadelas) durante a subida para a Rua da Barroca. Rumo à galeria que esta noite abre o segundo andar em prol de sossego ao violino de Samara Lubelski, que acaba de editar o seu sétimo registo intitulado “String Cycle”. A artista conversou connosco há pouco tempo e revelou que este álbum é fruto de pura improvisação, gravado rápido e sem interrupções. E é isso que prometeu para as actuações desta nova tour que a leva igualmente à Culturgest do Porto e à Casa das Artes de Coimbra.

Os horários são os mesmo, não desobedecendo à ordem natural daZDB com a utlização da Sala da Baronesa, com os habituais trinta minutos de compensação para que chegue público. Naturalmente escasso nesta noite, todavia as cerca de vinte cadeiras estavam todas prenchidas e outro punhado pequeno de gente observa, em pé.

Analisam, ou tentam. Manuel Mota, acompanhado pela guitarra e protegido pelo guarda-costas da amplificação, dedilha, cuidadosamente. Iluminado minimalmente por um projector amarelo, constante, é como se desactiva-se um mecanismo explosivo no interior do instrumento. Com harmonia contida de pânico, quiçá fuga, ou será de perda? Mas é triste, sem dúvida. Blues sem ritmo, indecisos e contidos. Monócordicos praquejos, seguidos por pedidos de desculpas apenas pensadas.

Intervalo para um cigarro, beber algo, quem sabe algo mais. A maioria dos sentados deixou-se estar, habituados a estas noites, sabem que não tardará muito: já durante a performance anterior se encontrava outra cadeira onde aos pés se dispunham os utensílios extra ao violino de Samara Lubelski. Quando entra havia ainda muito barulho de passos e vozes, este dissipa-se perante os primeiros choros do instrumento.

A artista nova-iorquina transfigura a azáfama alienada e de olheiras carregadas em ambientes límpidos, naturalistas e emocionais. Com o recurso ao loop, vai criando ambientes que impede que imperem num só estado de espírito, com incurssões repentinas e intermitentes. De leito quente e vento frio, diferentes sentimentos numa espiral de acontecimentos sonoros. Apela tanto à incompreenssão dos desígnios da vida, ao frio cortante da solidão, ou ao calmo abraçar da morte sem ressentimentos e hesitações. Caminhos estreitos, no fundo, evocados a noite passada na ZDBpelas cordas do violino de Samara Lubelski.