Há uma qualquer incongruência na existência dos Roll The Dice. Não é a sua música, não é a sua abordagem à espacialidade da electrónica, não é o conceito de auto-conhecimento e de busca que os rodeia. É, antes, o nome em si. Uma confortável e agradável incongruência, permitam-me a correcção e o explicar porquê.
Lancemos os dados. A probabilidade de sair o número que nós queremos é pequena. É curta. Estamos, como Ulisses, fadados ao destino, à mão dos deuses. Não interessa concretizar a probabilidade de sair um duplo seis já que a decisão, por mais efabulada que seja, não nos pertence a nós, não a controlamos. É algo que nos escapa.
Lancem os dados Peder Mannerfelt e Malcolm Pardon. A probabilidade de saírem dois sons iguais é mínima, quase nula. Porque eles assim o querem. Mesmo a jogar com algo tão volátil como o som, eles são os deuses que decidem a vida Ulisses, eles são o fado que controla o seu próprio fim. É esta a saudável e saudada incongruência dos Roll The Dice. Assumirem o descontrolo que controlam quando e como querem – basta-lhes ligar a máquina.
Tudo muito orgânico, tudo muito coeso e quente. É assim a abstracção da dupla sueca, rapidamente transformada em narrativa quando os primeiros sinais sintetizados nos circundam no Maria Matos. Começam de mansinho – “era uma vez”, parecem dizer em compasso de espera –, para partir numa climática (de climax lá no alto e não de clima) panaceia-odisseia em regime paisagístico, por localidades que convidam à introspecção, à busca de uma iluminação própria e pessoal.
A música perspassa-nos, eleva-nos e subleva-nos em ritmos tão ondulantes como bruxuleantes. A força da criação contida em In The Dust, não sujeita à probabilidade do lançamento dos dados, mas antes descontroladamente controlada de perto, embala-nos num conforto seguro. E com a electrónica como palavra de eleição, porque o é embora soe a organismo vivo, as imagens não cessam de nos chegar numa tela projetada que nunca atrapalha as figuras de Peder e Malcolm.
E no final, um final suave e igualmente abrupto, percebemos que a ciência dos Roll The Dice se mantém incongruente, mas sincera e honesta. O controlo do descontrolo da propagação assenta-lhes bem, é bem-vindo e está aberto à presença de todos nós.