Senhoras e senhores, palmas para o concerto mais adorável do ano. Os Real Estate não são geniais, nem em disco nem ao vivo, mas possuem na sua música um espírito de ingénua simplicidade e de juventude que contagia facilmente e que esgotou rapidamente uma ZDB em noite de Inverno, no mesmo dia em que decorriam concertos em vários cantos de Lisboa, graças ao Mexefest (que, parece, também esgotou).
A abrir estiveram as Pega Monstro, da Cafetra, que nos últimos meses têm visto uma crescente de popularidade. Ou se gosta… ou não. Letras inconsequentes (eu também tenho uma afta e não sei de onde ela veio, mas não vou fazer uma música sobre isso), por vezes ridículas ou a roçar o tão-mau-que-é-bom, voz sem grande timbre por vezes assustadoramente perto dos guinchos, mas tudo isto é (quase) disfarçado pela óptima conjugação entre guitarra e bateria. As Pega Monstro cantam mal, escrevem ainda pior, mas sabem bem o que fazer com os instrumentos que têm nas mãos. A parte instrumental é superior a tudo o resto, e por vezes fica-se com pena da curta duração de cada música… ou de não serem uma banda post-qualquer coisa sem voz. Mas gostos são gostos, muita gente com óptimo gosto as adora (*ahem*Paulo André Cecílio*ahem*), e foi bonito ver parte do público a cantar aquelas espantosas letras e a reconhecer tudo do início ao fim. E elas são, diga-se, francamente adoráveis. Carisma, ou pelo menos uma aparente simpatia, não falta. Se têm futuro, apenas o tempo o dirá. Por agora, resta esperar que melhorem. Mais instrumentos, menos voz. E escrevam menos. Por favor, escrevam menos.
E pouco tempo depois, lá entravam os Real Estate, com ar francamente satisfeito, para aquele que há-de ter sido, sem dúvida, um dos concertos mais agradáveis e relaxados do ano. Quem tinha expectativas altas (não era o meu caso) não há-de ter saído defraudado. Days é, claro, um excelente disco, e esperava-se já que tudo aquilo resultasse tão bem ao vivo… e tendo em conta que o tocaram do início ao fim, ou perto disso, a noite ficou logo ganha.
Há uma falta de pretensão naquilo que os Real Estate fazem, tanto em palco como em disco. O baixista faz brindes com copos de cerveja logo à segunda música, o teclista às vezes não tem nada que fazer por isso fica sentado a dançar em cima da cadeira, e o guitarrista da esquerda tem literalmente um sorriso do início ao fim. Parecem estar a divertir-se ao máximo, e a interacção que fazem vale mais por essa atitude que por um “Adoramos Lisboa e é óptimo estar cá” (apesar de, sim, eles também disseram isso… e até pareceram honestos). O concerto nunca chega ao genial ou ao memorável, mas também não tem de o fazer; esta é música relaxada, agradável, para ouvir como se estivéssemos no Verão e não no Inverno.
Tocam todos em conjugação perfeita, e coisas como It’s Real(bonito, ouvir tanta gente a cantar o coro) ou Easy, que teve honras de abertura, resultam lindamente ao vivo. É notável a consistência, a forma como tudo soa tão bem, e como aquelas canções curtinhas e directas causam tantos sorrisos e tanto bem-estar. O concerto nunca cai no aborrecimento, mesmo com aquela fórmula que está patente no que fazem, e que se viu facilmente nas passagens das músicas deste disco para as do anterior. Fake Blues, por exemplo, bem que poderia pertencer a este segundo disco, e o mesmo se pode dizer em relação à lindíssima Suburban Dogs. É uma fórmula que (por agora) não cansa nem soa redundante, e há que dar valor à banda por conseguir soar sempre tão bem mesmo nunca saindo do mesmo estilo; consequência do simples facto de serem todos eles óptimos músicos (o baixista, em particular, é notável). As músicas, ao vivo, são aquilo que são em disco: divertidas e agradáveis. Ainda assim, é impossível não ficar com pena por terem faltado algumas do primeiro disco (ainda que, diga-se, este segundo é bastante melhor). Algo que seria de esperar e, claro, sejamos honestos: com aqueles dois discos, eles bem podem tocar o que quiserem, que o sucesso é garantido. São, ao vivo, iguais ao que são em álbum: consistentes.
Foi, afinal, um regresso ao Verão em noite de Inverno. Um público sorridente em ambiente caloroso, uma banda que adora o que faz, e um serão que parece ser passado em amigos. Não há-de ter marcado a vida de ninguém, nem ficará como o concerto mais memorável do ano (Days, no entanto, bem que merece um lugar no top de discos), mas também não tinha de o ser. Os Real Estate, afinal, não querem isso; só se querem divertir. E nós também. Concertos assim tão genuinamente agradáveis são, afinal de contas, raros. Resta esperar que voltem cá em breve, seja em que altura for.
Com eles, ao que parece, é sempre Verão.