Escrever sobre os Pop Dell’Arte é uma enorme responsabilidade. Poucos foram os grupos que revolucionaram a maneira de se fazer música em Portugal, como o colectivo de João Peste fez. E agora, quinze anos depois, esse mesmo colectivo regressa aos álbuns, apenas com Peste e Zé Pedro Moura a representar a formação inicial, na actual banda.Contra Mundum é um disco único, um disco de (re)afirmação de uma identidade muito própria, ou como eles próprios chegam a dizer, num tema, ”we are the ones”. Musicalmente, os Pop Dell’Arte continuam irrepreensíveis. A bateria está lá, a marcar o ritmo, sublimemente; as guitarras voltam a ficar nos ouvidos; os efeitos e a riqueza instrumental continuam e até acabamos por ter cheirinhos a Sex Symbol, como se uma analepse em My Ra Ta-Ta nos levasse, direitinhos, ao brilhante hino dos noventa, Poppa Mundi.
Se, por um lado, temos os vocais quase imperceptíveis no single de avanço, Ritual Transdisco, por outro, ainda no mesmo tema, há uma melodia de teclados, bem ao estilo do colectivo de Campo de Ourique, que nos acalma e desperta o desejo, tudo simultaneamente.
Simples, o início de Wild’n’ Chic, muito bem orquestrado pelas guitarras e pelas gaitas-de-foles, com riffs repetitivos que crescem, tornando-se quase épico faz-nos lembrar um pop-rock de qualidade, que roçam uns The Beatles, pela positiva.
E de eclectismo também se faz um disco. Por um lado, Slave for Sale mostra o verdadeiro camaleão de João Peste por retroceder connosco umas décadas até a um post-punk à la Bauhaus, enquanto que Noite de Chuva em Campo-de-Ourique, meio spoken-work, nos conduz à poesia e nos faz sentir saudades de tempos idos, a dor desse sentimento tão português, num dos temas mais bem conseguidos do álbum. Pelo caminho, ainda temos os dançáveis Eastern Streets e Mr. Sorry, com a melancolia sempre presente (sabem aquelas canções alegres que são tristes?).
Mas, é para o fim que o brilhantismo dos Pop Dell’ Arte se vai aguçando. O piano e os sopros de Diary Of A Soldier (I Saw U Dancin’); a sexualidade de (How I Miss Your Furious Kisses) In My Room; a visita à electrónica em Electric G e a deliciosa expressão de amor em La Nostra Feroce Volontà D’Amore arrebatam-nos completamente, façando que não consigamos deixar de ouvir o disco, do início ao fim.
Har Megido’s Lullabye fecha um disco de excelência, em excelência. O fim, a morte, a tristeza estão todas em Contra Mundum, mas estão tão bem pintadas, tão belas, que não conseguimos deixar de sorrir e apreciar a música. Num disco de contrastes, o importante a reter mesmo é: quinze anos depois ainda há boa pop para os lados de Campo de Ourique. Quinze anos depois, os Pop Dell’Arte logram em marcar pontos quinze vezes mais.