Stephen McBean quebrou o mau hábito da ausência com uma passagem por Portugal, inédita, com direito a duas partes. O líder da família Black Mountain abandonou, por momentos, o lado negro da força e trouxe-nos o seu side-project Pink Mountaintopsao Porto e a Lisboa (ZDB).
Acompanhado por Gregg Foreman (Delta 72/Cat Power) nos teclados e sintetizadores – um verdadeiro match made in heaven –, McBean apresentou uma versão “mais negra e psicadélica” do seu projecto egocêntrico, mas nem por isso egoísta. Menos democrático do que nos Black Mountain, em Pink Mountaintops é ele quem dita as leis e nós agradecemos por isso, seguindo, alínea a alínea, música a música, as regras que nos levam a um inevitável êxtase musical.
I (Fuck) Mountains, do primeiro álbum (Pink Mountaintops, 2004) desbravou o terreno melódico, de guitarras lânguidas e hipnotizantes, para dar espaço à mais acelerada The Gayest of Sunbeams, já do último registo Outside Love (2009), em queForeman se assume quase como “maestro”, sublinhando “sintetizadores que dão calores”, como diria João Bonifácio – e, nem de propósito, de negro integral, como quem representa, ele próprio, um lado sombrio de McBean menos descoberto nesta face da mesma moeda.
Entre “suor e fantasia”, há qualquer coisa em McBean que nos faz pensar numa visita ao confessionário mais próximo: pregador de um amor que se quer moderno, transgride os bons costumes e oferece-nos rock de palavras sem vergonha nem pejo. Lentamente ou o mais rapidamente possível – o paradoxo vive, como nunca, em cima do palco -, as músicas são despidas com prazer, de forma não raras vezes libidinosa.
Sweet ‘69, também do primeiro álbum, fez com que até o mês de Novembro de esquecesse do Outono, provando que o calor, também ele, pode ecoar numa sala. De riffs poderosos e bem (de)marcados, a sala (quase cheia) acordou – aviso à comunidade: nos momentos mais lentos, a música de Pink Mountaintops pode ser hipnótica – para o lema sexo, droga e [deus do] rock ‘n’ roll, de pés batidos no chão e cabeças enérgicas a marcar compasso.
Com breves passagens por Axis of Evol (2006), através de Plastic Man, You’re The Devil e Slaves, houve ainda direito ao inédito You Can Dream e ao cinematográfico Through All The Worry (Everything Louder Than Everything Else OST), mas o concerto centrou-se sobretudo no primeiro e no último álbum da banda de Vancouver.
Num concerto de texturas completamente diferentes, While We Were Dreaming (estandarte de Outside Love) mostra que o lado mais feminino de McBean está ali, bem presente, de olhos cerrados, voz arrastada e distinta, que faria de Lou Reed um mestre orgulhoso. Já em Rock ‘n’ Roll Fantasy, a mesma voz dá vida a outro tipo de sussurros, daqueles que fazem qualquer um corar: ““When I came all over myself/ Wish I came all over your blouse.” É caso para dizer que não há Avé-Maria ou Pai Nosso que nos valha. O melhor é que, aqui, há quem não queira ser salvo.
Com Stephen McBean e Pink Mountaintops percebemos que os maus hábitos são, de facto, difíceis de matar. Esperemos que estes – cantados aos nossos ouvidos – perdurem e voltem a passar por cá. Nós, pecadores, estaremos prontos para nos confessar.
A abrir as hostes esteve Cavalheiro, alter-ego de Tiago Ferreira (ex-Veados com Fome e Território), num concerto morno e arrastado, de canções que carregam o peso na língua e estórias nas palavras. A música do portuense, que em Abril lançou o EPFarsas, perdeu para o burburinho presente na sala, claramente ansiosa pelo concerto seguinte. De destacar as versões inesperadas de One, de Harry Nilsson, e de Dancing in the Dark, de Bruce Springsteen. Apesar de tudo, louve-se a nula artificialidade de Cavalheiro, a quem se adivinha que as músicas lhe nasçam, naturalmente, na voz.
* Quinteto Tati
- I (Fuck) Mountains (PM)
- The Gayest of Sunbeams (OL)
- Closer to Heaven (OL)
- Plastic Man, You’re The Devil (AoE)
- Leslie (PM)
- Sweet ’69 (PM)
- While We Were Dreaming (OL)
- Cracks
- Slaves (AoE)
- Vampire (OL)
- Through All The Worry (“Everything Louder Than Everything Else” OST)
- Tourist in Your Town (PM)
- You Can Dream (2011)
- Rock ‘n’ Roll Fantasy (PM)
- Can You Do That Dance (PM)