Santiago Alquimista pouco composto em noite de Domingo para receber os veteranos Pendragon, nome que regularmente passa por cá (como eles próprios vieram a dizer durante o concerto), o que talvez explique a pouca adesão do público. Pouco mas devoto, constituído maioritariamente por uma faixa etária acima do quarenta, que sabia obviamente o que esperar e que, tal como visto quanto a banda perguntou quem os viu com os Dream Theater, no ano passado, já antes tinha estado presente num concerto da banda.
Duas horas de concerto onde o Prog Rock foi rei e senhor: muito teclado (tinham quatro em palco), faixas longas e com longos pedaços instrumentais, e duas telas a projectar vídeos por trás, com um ou outro a resvalar para o psicadélico. As letras apelam ao espiritual, por vezes à crítica social, e são sempre cantadas a boa voz por um vocalista informal e bem disposto. Rock progressivo de alma clássica, tocado perante fãs também eles clássicos. Para os devotos, terá sido talvez uma noite a relembrar por muito tempo; para os restantes, dificilmente terá sido tempo perdido. Os Pendragon estão em forma, adoram o que fazem, e fazem-no com empenho, esteja muito ou pouco público.
Antes da banda entrar, o aquecimento coube a Andy Sears, que tem andado com o grupo em digressão. Carismático, over-the-top e cativante, Sears conseguiu captar a atenção dos presentes com o seu estilo peculiar, interpretando cada canção com alma (talvez demasiada alma, para muitos…). Passou a maior parte do tempo ao teclado, e quando tal não acontecia usava o seu iPhone para pôr as músicas a tocar em instrumental, cantando por cima; visão estranha, mas que acabou por resultar. Ainda assim, os melhores momentos foram, sem dúvida, os passados ao teclado. Fez algumas piadas, interagiu regularmente com o público, e cantou com intensidade cada canção (momento assustador, quando cantou uma música supostamente anti-fascista, chamando perto de si membros do público e cantando-lhe aos ouvidos, acabando a canção deitado no palco após algumas risadas esquizofrénicas). Um pop-rock (creio que é onde melhor se encaixa) algo genérico, mas que vale por quem o canta. Melhor momento? Provavelmente Riverside, canção curta mas bela. “Muita gente se acobarda quando as coisas se complicam, enquanto outros por vezes avançam demasiado em frente e nunca mais regressam. A isto chama-se frequentemente de suicídio. Esta canção é para um amigo meu”. Momento sensível, calmo, e honesto. No final, fica a sensação de uma meia-hora interessante e bem passada, algo que se viu pelos aplausos ouvidos. Vinte minutos depois, chegava o prato principal.
Os Pendragon entram em palco acenando ao pouco público que os recebia, e atiram-se de imediato ao som que os caracteriza. Está ali tudo: os fortes teclados, sempre tão bem usados e em perfeita sintonia com tudo o resto; a imponente linha de baixo; a guitarra sempre presente e que por vezes se estende em solos de longos minutos. O quarteto (teclista, baixista, guitarrista/vocalista, e baterista) está em boa forma, e isso foi desde logo óbvio. Não são particularmente comunicativos ao início, mas não tardam muito a começar a sentir-se mais à vontade e a interagir com o público, instalando-se um ambiente de informalidade que foi um dos triunfos da noite. “Já cá viemos várias vezes”, diz Nick Barrett, guitarrista e vocalista, antes de começar a fazer uma lista dos vários concertos que deram no nosso país. “E depois houve aquele, há uns anos… em Lisboa, não me lembro da sala… “. Alguém grita “Aula Magna!”. “Exacto, aí mesmo! O quê? Faz parte duma universidade? É onde dão aulas? Bem, agora arrependo-me de lá termos tocado! Não somos nenhuma banda escolar!”, diz, com uma risada. Química perfeita entre público e banda (momento bonito quando um fã aplaude de forma entusiasmada à menção de um dos álbuns, e o vocalista o encara dizendo “Que bonito e simpático da tua parte em teres comprado esse álbum. Muito obrigado”), possível apenas quando uma banda já existe há umas boas dezenas de anos e mantém ainda assim a humildade e o empenho de quando começou.
Os clássicos obrigatórios estiveram lá todos, sempre entregues e interpretador de forma fiel e por vezes francamente épica. Ghosts não tardou muito a surgir, e foi o primeiro grande momento, com aqueles primeitos minutos instrumentais a arrepiarem a cativarem qualquer um com o seu ritmo rápido e intenso. Nostradamus (Stargazing) também esteve presente, sendo logo recebida com aplausos aos primeiros acordes, e foi talvez até o grande momento da noite (aqueles teclados…). Passaram ainda por algumas do mais recente disco, que ao vivo consegue igualar os clássicos, num concerto coeso e bem pensado (Passion, faixa-título deste mais recente trabalho, resultou particularmente bem). Foi exactamente com Nostradamusque terminaram o corpo principal do concerto, perante aplausos e gritos daquele público quarentão que tanto os adora. Não tardaram muito a voltar… primeiro, comPaintbox (cantada a uma voz pelo público, com uma linha de baixo notável e um solo final de teclado irrepreensível… e, claro, aqueles clássicos solos de guitarra), e depois, com novo regresso ao palco num segundo encore, com a canção que jamais poderia faltar. “Tocámos em Sintra uma vez, e é engraçado porque Sintra é famosa por uma coisa: fantasmas. Esta próxima música é sobre o lado espiritual da vida. Esta canção chama-se The Last Man on Earth”. O público delira, aproxima-se ainda mais do palco (e bem colados a ele estiveram durante duas horas…), e segue-se um dos momentos da noite, naquela épica canção de quinze minutos que é, toda ela, um monumento do género (quer se goste, quer não). De seguida agradecem com um sorriso de orelha a orelha, acenam, vão ao público distribuir high fives, e depois desaparecem finalmente pela cortina.
Duas horas, dois encores, clássicos intemporais, e um público mais que satisfeito. Viam-se sorrisos no final, para onde quer que se olhasse, e não foram poucos os que correram para a mesa de merchandise para comprar uma t-shirt. Os Pendragon podem não encher salas como dantes (talvez se não fosse num Domingo, ou se não viessem cá tantas vezes…), mas é inegável o amor que ainda têm pelo que fazem e a perícia que possuem. Todas as canções interpretadas com alma e sem falhas, sempre com empenho mesmo perante o pouco público que tinham à frente. Rock Progressivo clássico, feito por quem dele faz parte há tantos anos e continuará a fazer por muitos mais, acredito. Com concertos assim, nada mais seria de desejar. O Prog Rock está vivo e recomenda-se, e os Pendragon também.