Terceira parte de uma história que nunca acaba, descobrem-se olhares esgazeados por entre as verdes sebes, nos recônditos ângulos de uma plantação de tendas, quais labaredas de plástico ao sol, alguém cantarola Tony Carreira como se lhe pagassem para isso, apresento o lugar ao meu cigarro apagado entre os dentes, e com isto vou enchendo os bolsos de cinza despreocupada, amplos ervaçais encontram-se num Taboão que vomita gente, não lhe cabe nem mais um estropício de carne humana naquele estômago alagado, bolçam-se palavras de fastio à guitarra, e há sempre um cabrão que traz a guitarra, queimam-se vontades nos lábios, gastam-se três quartos de tarde com os pés espetados no ventre daquele rio que está à beira do suicídio, por ele o aquecimento global vinha já hoje.
Sons encaracolam-se-me pelo pescoço trazidos no colo de um ventinho malabarista enquanto mastigo uma seca sandes de paio, há um voluteio de tédio que acaba aos pés dos Allah-Las, essa banda que mais parece um carregamento de haxixe com óculos de sol, bato com as patas no chão como um potro esfomeado a cada guitarra deserta, isto é tudo uma cambada de mercenários à procura do melhor pólen!, capitães de esquadrão os Allah-Las misturam-se com aquele sol pronto a mudar de turno, a populaça espalha-se sentada como um bibelô que pulsa, quentes baforadas garage serpenteiam pelo ar, cato-as como um argonauta ressacado à espera de um abraço.
Satélites trémulos cambaleiam no meu horizonte, fosfenos-assombração que surgem como canibais para me levar o Mark Lanegan pelo braço, mas eu não deixo, era o que faltava, um nevoeiro tudo-nada ébrio torneia-lhe a figura de pastor evangélico que desceu ao inferno, trouxe de lá a voz de um pária que se embebeda com mercúrio e chumbo, o escalpe de pelejador vai cedendo a uma esquálida e teimosa calvície, à minha volta uma cambada de animais que não se calam, taberneiros a quem só lhes falta o avental e o cheiro a cebola azeda, chiu, caralho, os latidos baixam, tornam a baixar, sossegam, o coiote Lanegan benze as rugas com “Hit The City” e sarapinta-se de Joy Division, ninguém com a t-shirt do “Atmosphere” entende o ocorrido, processa-se um fandango de areia e tabaco que me empapa os cabelos com a argila de Tulsa até ser Merchandise.
Corro-lhes para os braços como uma putinha fácil, são a melhor banda que este planeta pariu desde, sei lá, os Rocket From The Tombs, assumem-se naquele carroção secundário como fugitivos de uma festa cadavérica onde cedo se acabou a branca, esgalgo-me num frenesim atávico para irritação periférica, guitarras balsâmicas estalam a língua de feedback nas grinaldas de “In Nightmare Room”, houve melhor música do que esta em todo o festival?, claro que não foda-se, post-punk que faz murchar o pessoal boa onda, a canalhada hippie que volte lá para os Tame Impala, andor vá, os Merchandise são bispos negros de uma realidade falstaffiana onde todos acabamos ao balcão, mortos de álcool e desprezo, o abdómen tolhido pelo reverb cinza que vale ouro em tempo de guerra.