Disformes alcateias de homo sapiens conglomeram-se em trajes mínimos pelos bosques, pelos latifúndios de um Paredes de Coura onde somos nómadas sem remédio, desgraçados que pensam ter graça, desgrenhados barbudos num pandemónio de calções às flores, havaianas dos chineses que decrépitas contracenam com t-shirts de Tame Impala num camaleónico final de tarde onde todos são garbosamente lúbricos de garrafa na mão e maço de tabaco noutra, fuma-se má droga em Portugal e a música dos peixe:avião agonia-me, sucos gástricos desprendem-se-me esófago acima a cada palmada nas nádegas mortas de Radiohead, controla-te, não penses no zarolho do Thom Yorke agora, almocreves que trazem às costas um rock desfeito em pechisbeque, que pasmaceira, não entendo, se calhar vou ao contentor da Vodafone.fm perguntar, o consumidor tem direito a ser esclarecido, bato no vidro, mas eles estão muito entretidos numa conversa muda entre dúzias de sonâmbulas playlists automáticas.

Fujo para ir ter com os Pond, cães de loiça psicadélica que vão rasgando com os dentes a inocência daquele palco, os meus amigos, apertados num corrimão de carne humana, aprovam com o polegar, mas eu não confio em bêbados, cavalgam os australianos escarpas de cogumelos raiados, parecem saídos de um chá das cinco que deu para o torto, trocaram-lhes a framboesa por mescalina e agora é vê-los com sede de travestismo psíquico usando a roupa interior dos maninhos Tame Impala, um transitivo espiritual em cada guitarra ecuménica, um verbo exótico que só se compreende na realidade austral, está gente que fode!, uma concentração radical de feromonas e jogos de poder não declarados, cheira a fritos, toda a gente se esqueceu do Steve Gunn ao lume e não sou eu que vou lá buscá-lo, vai tu, agora é deixar arder e esperar que a noite se sindicalize na luta estilosa de White Fence.

Há qualquer coisa de encantadoramente podre subjacente ao frenesim inconsciente do Tim Presley, gajo que amarra a guitarra ao pescoço como se lhe fosse coleira, um proletário pela nicotina termodinâmica que lhe enche os pulmões de tesão, um hipopótamo que se julga pantera, poderia competir em horário nobre com o tigre português, um one-man show ou um one-trick pony conforme as leis de mercado, procura e oferta, elásticos rés maiores que têm o sangue rubro da carne viva, o guia prático para descobrir o que é que os amigos do Ty Segall escondem no bolso de trás, parece branco, e branco é o Father John Misty, esse impostor de Jim Morrison, com tiques salvíficos, mate, guarda isso para ti, não me esfregues os tomates na cara, folk com a sensibilidade de um tijolo feito por um tipo que se convenceu que agora no século XXI é que vai ser pá, vou ser o Fela Kuti dos burgueses com um compound cheio de mamas ao natural e uma alergia unipolar a giletes, eu e o Liam rimo-nos deste bartolo por engomar enquanto vemos quanto tempo falta para os Iceage voltarem a provar que são a melhor coisa a sair da Dinamarca desde o Peter Schmeichel.

Vi-os mais vezes do que posso aqui contar, beijei Copenhaga só para apanhá-los quando cantarolavam “New Brigade”, espanto geral: continuam miudinhos, uma sensibilização de alma feita num punk parido com as patas ao contrário, o Elias Bender calça as botinas fúcsia do Nick Cave, ficam-lhe bem, fica-lhe tudo bem, um punhado de folhas desprende-se de um céu lívido que não suporta a beleza de uma “On My Fingers” outonal em choque térmico, ainda não se tinha escutado um baixo assim em Paredes de Coura, que cinto de graves medicinais, aperto-o contra o peito enquanto danço num perímetro de desmame punk, sou eu e um cronómetro de pó, o meu último cartucho de vida gasto no rock cubista dos Iceage, poetas olímpicos que escrevem em branco para deixar os analfabetos à toa.

Numa esquina movimentada apanho os Tame Impala de joelhos flectidos, transpiro pelas metanfetaminas que me dão aquele aspecto pós-coital – e se calhar –, estamos todos num gigantesco confessionário de rendinhas hippie, queima-se erva como se fosse carvão de Birmingham, um toureio psicossomático entre ácido-veneradores e provadores de poltrona, os australianos vão fingindo que fingem numa lânguida procissão de electrónica borrada e psicadelismo vigilante, ninguém se convence com o novo disco fora os bêbados que aplaudiriam até um nevão que lhes caísse ali no lombo, trocam-se narcóticos auditivos como cartas de amor em trincheiras, um miúdo grandalhão só quer a BACKWAAAAAAAAAAAAAAAAARDS, o aspecto ariano dá-lhe um ar imperativo e os Tame Impala obedecem com medo, lá vem ela, Ó, LÁ VEM ELA, LIGA O TELEMÓVEL CATARINA, GRAVA ISTO, os filantropos do online vêm-se num orgasmo colectivo de embaciar os vidros das camionetes da Renex e eu apanho com um bocado daquela nhanha na vista, BLERGH, limpo-me às mangas, puxo o fecho ecler até à garganta, e saio de cena como um proxeneta de cu bamboleante para o after-hours.