“Nada prova que somos mais do que nada”. A frase tem dono: Emil Cioran, falecido escritor romeno que recheou o seu séc. XX de niilistas reflexões. Pungentes, capazes de deixar Schopenhauer abananado e Camus enrodilhado no eterno calhau de Sísifo. É essa a declaração presente nos segundos iniciais da metragem atribuída a “The Rites Of Love And Death”, tema que em 2012 a gris selou o EP “Downward Years To Come”. Dificilmente lá foi colocada por obra do acaso; é que os NOTHING são um nostálgico sarau sobre o nada. Um efémero slow noturno, dançado à luz do absurdismo e das taliscas roubadas à palidez de Kevin Shields.

Os ecos de My Blood Valentine são tão induscutíveis que um pleonasmo quase se torna referi-los. Aquela esbatida aura shoegaze, como se do corpo humano apenas sobrasse ectoplasma e outro qualquer momento visível só a olho médium, percorre todos os minutinhos de “Guilty Of Everything”. Por vezes, à vontade de carpir (dominante, sempre), junta-se um nervo de quem nesta vida já foi outra coisa – e não é que etimologicamente a palavra pessoa deriva de persona e, por consequência, significa máscara/personagem? Ora, há uma década, Domenic Palermoberrava no cacofónico hardcore dos Horror Show, uma das primeiras bandas estampadas pela Deathwish Inc.. Volvido esse período, que lhe trouxe a morte do guitarrista Josh Tshirlig e um período de encarceramento por ter esfaquiado um homem, Nickyadoptou o fechado semblante de quem trocou os discos de In My Eyes pelos de Flying Saucer Attack. À semelhança de todos nós, a uma caída máscara outra se sucede.

“Guilty Of Evertying” deixa fugir por entre os dedos esses vislumbres punk de outrora. “Get Well”, antes de se diluir num vaporoso carrossel de delays, pulsa assertivamente. “Bent Nail” imita-a. Esforços inglórios de recuperar juventude: Domenic acaba, quase por decreto de alma, vergado à mesma tristura com que os The Cure sufocaram “Disintegration”. O tema “B&E”, escrito há uns bons quatro anos, e o melhor de todo este LP primeiro dos NOTHING, resgata essa amargura num perfeito crescendo que escrito só poderia ter sido por quem sabe que, após o seu definhamento, o mundo cá continuará indiferentemente plácido. É a noção de finitude que permite criar coisas assim bonitas. É o nada que nos move.