Num cartaz totalmente europeu, coube aos lisboetas Neighborz a missão de representar o hardcore nacional. Atravessaram o Tejo, trouxeram o seu desarmante groove e tentaram acalorar uma sala dada, por aquela altura, a pouco mais do que o ligeiro abanar de cabeça. Aplausos também os houve, muitos, principalmente no fim, sinal de que os Neighborz cumpriram positivamente a sua tarefa e deixaram a sua mensagem de união a ecoar pelas paredes do Revolver.
De Lisboa viajou-se até Vigo. Ou melhor, Vigo viajou até nos, representados pelos We Ride. Sendo a cidade galega um dos fervilhantes pólos do hardcore ibérico, não admira que a banda espanhola já tenha a escola toda. Admirou, isso sim, a garra com que Mimi, a vocalista dos We Ride, berrou e atiçou a plateia durante meia-hora. De aparência franzina, mas com uma alma inesgotável, a líder galega parecia ter energia para mais uns bons minutos, juntamente com os restantes três membros. É pena que não tenha havido mais, mas deste concerto retêm-se duas ideias principais: os We Ride foram a melhor banda da noite depois de No Turning Back e Directions, o único álbum da curta carreira dos espanhóis, merece ser escutado.
Não é muito comum encontrar uma banda búlgara por palcos nacionais. Contudo, a vinda dos Last Hope a Portugal justifica-se em pleno. Os homens de Sófia já andam nestas lides desde 1994, uma eternidade para qualquer grupo, principalmente quando se tem o hardcore como a principal linha orientadora. Com este respeitável legado, os Last Hope trouxeram a Portugal um estilo bem old school, que se mantém no novo disco, amplamente apresentado no palco do Revolver. O público aderiu e quando foi altura de tocar FP (Fuck Police) os corpos despertaram em pleno, para felicidade dos quatro búlgaros. Um bom concerto, que terminou com promessas de regresso. Afinal, os Last Hope da Bulgária querem, um dia, tocar com os não menos emblemáticos Last Hope portugueses.
Entre os No Turning Back e os portugueses já não há espaço para segredos, para desconfianças ou para aquela timidez que enferruja muitos concertos. Nada disso: a ligação entre os holandeses e o público nacional é um verdadeiro case study, não só nos meandros do hardcore, como num plano musical mais amplo. Parecendo que não, os No Turning Back, com esta data no Revolver, somam vinte visitas a Portugal em nove anos, onze delas na área da Grande Lisboa. Parece muito, mas, tanto a banda, quanto os seus fieis seguidores não tencionam terminar esta cumplicidade tão cedo.
Basta que Never Give Up se faça ouvir para que a romaria em direcção ao microfone se torne imparável e tumultuosa. Martijn van den Heuvel, o vocalista, não se deixa surpreender, bem pelo contrário. Pedindo sempre mais e soltando impropérios na língua de Camões, o holandês conhece na perfeição as potencialidades caóticas do público que se lhe depara e foi até com alguma decepção que notou que o Revolver não ultrapassou a barreira da insanidade, algo que marcou muitas das outras passagens dos No Turning Back por Portugal. Talvez por ser uma quarta-feira, talvez por For The Glory não ter feito parte da abertura das hostes, como é habitual.
Ainda assim, o que para os holandeses é uma actuação um pouco abaixo das expectativas, para a maioria das bandas é uma performance memorável. Quantas se podem orgulhar de lançar um álbum e poucos meses depois já terem um público que conhece cada verso de uma In Your Maze ou Not Anymore? É por esta fidelidade constante, e por momentos como aquele em que um membro da plateia decidiu atropelar Martijn plateia adentro com um stage dive, que os No Turning Back nunca negam uma visita a Portugal. É o ‘Tuga Style’, como repetiu vária vezes o vocalista holandês, entre faixas como Picture Perfect Smiles ou True Colors. Um ‘Tuga Style’ que leva Martijn, até, a sonhar com uma casa em Portugal, onde possa envelhecer e recordar os bons tempos que por cá passou, com aqueles que nunca abandonam o movimento. E foi para esses que, no fim, os No Turning Back tiraram do bolsoThe Truth, cover dos clássicos Bulldoze, num término arrepiante e que fez com os vários microfones de palco fossem raptados pela plateia. Cessados os instrumentos, Martijn caiu de joelhos, a recuperar o fôlego. São os No Turning Back, sem mais, nem menos.