A despedida de Rust em True Detective aplica-se bem à história dos Menace Ruine, que, ao abandonarem definitivamente o extremismo dos primórdios da carreira, assinaram o seu mais luminoso trabalho até hoje.
Não andará mesmo muito longe de ser o melhor disco da banda, se bem que as diferenças estéticas (como a continuada ausência de berreiro de S. de La Moth) entre “Venus Armata” e um “The Die Is Cast” tornam a comparação directa algo despropositada. Enalteça-se sim a prevalência de uma beleza reconfortante que atinge aqui uma dimensão inédita na discografia do duo. As densas atmosferas infernais dissolveram-se e o que restou foi um desolado deserto que a voz de Geneviève Beaulieu transforma em local de culto.
Sendo a composição inegavelmente menos extrema, não se espere uma ausência de dissonância ou um instrumental meloso e fácil de digerir. É mais subtil, sim, mas ainda é no drone que se enraíza, algures entre um ambiente de ruína pós-apocalíptica e uma liturgia medieval. Há maior critério na utilização do ritmo, a meio tempo na lindíssima “Red Sulphur” ou apropriadamente fúnebre em “Torture Of Fire”. Uma “Belly Of The Closed House” exercita auto-controlo na construção com cordas durante a primeira metade dos seus quase dez minutos, transitando com perfeita fluidez na segunda metade para acompanhar e suster os encantamentos de Geneviève. E é à voz que irremediavelmente voltamos, à forma como molda palavra em melodia e à sensação que encerra em si algo terrivelmente humano. Continua assim a percorrer o caminho sugerido no álbum de Preterite do ano passado, “From The Well”.
Uma referência ainda ao enorme tema título, exemplo de tudo o que referimos (e do que não mencionámos, como a elevada qualidade das letras) e um cair do pano perfeito para “Venus Armata”. Voltamos então à ideia de que não há luz sem treva e no fundo é com isso que os Menace Ruine jogam aqui, conciliando ásperos instrumentais com a desarmante beleza do cantar de Beaulieu com resultados impressionantes.