Foi desta. Finalmente os MayheM pisaram um palco português, vinte e sete anos depois de tudo em Oslo começar. Vinte e sete anos impregnados de muito mais do que música, certo; porém, e olhando de soslaio para a numerosa e rendida plateia presente no Cine-Teatro, o que sempre conta, no final, é aquilo que é expelido através dos amplificadores e speakers. Nisso, os MayheM não só foram competentes, como tiveram momentos de uma abrasividade portentosa, que não embaraçaram em nada a imponente história do grupo.

Antes de a prosa sobre a performance dos noruegueses continuar, convém dedicar a atenção a Corpus Christii, a banda nacional que abriu para os escandinavos. E é uma atenção por demais merecida: o já consagrado projecto de Nocturnus Horrendus deu um concerto notável e robusto. Actuando durante uma hora, e de olhos postos emLuciferian Frequencies (que será lançado a 6 de Junho), o grupo, que conta agora com o experiente Andrecadente na bateria, mostrou uma boa coesão, em especial nos temas de Rising (2007), como The WandererTorrent of Sorrow ou Untouchable Euphoria. Nota ainda para uma maior versatilidade vocal do que aquilo que é habitual em Nocturnus Horrendus, que arriscou algumas passagens limpas com sucesso; senão fossem os constantes problemas com uma das guitarras, os Corpus Christii tinham arrancado um concerto a abeirar a perfeição, concerto esse que contou, ainda assim, com um excelente som para aquilo que é rotineiro em Corroios. Não é de admirar, portanto, que os MayheM tenham convidado a banda para actuar também no Porto. Merecido.

Os MayheM que, pelo contrário, até sofreram com o som logo no início. Depois de quarenta e cinco minutos de espera, com o pano do Cine-Teatro a ocultar os preparativos – dos quais se destacaram as duas cabeças de porco colocadas ao centro -, os cinco músicos entraram em cena com Pagan Fears. Contrapondo-se ao som atabalhoado, que teimava em ocultar as duas guitarras, Attila surgiu com as suas vestes e pinturas singulares, captando a atenção de olhares e objectivas. Mas o que é isso sequer comparado com a voz que detém? Pouco ou nada, meros ornamentos. Projectando-se em todas as direcções, o poder vocal do húngaro foi um dos pontos fortes do concerto dos MayheM – não será descabido apelidá-lo de Mike Patton do metal extremo, dada a multiplicidade de registos que consegue reproduzir, sem aparente esforço. Até mesmo quem o viu com Sunn O))) em Fevereiro de 2010 não terá ficado indiferente à cativante e imponente prestação de Attila Csihar.

O som, esse, foi melhorando ao longo do concerto, mas ficou um certo amargo de boca por se ter mantido quase sempre a um volume baixo, demasiado baixo, para aquilo que se pretendia. Ainda assim, o impacto de faixas como as míticas Freezing Moon e Cursed In Eternity, ou a mais recente Anti, abalroou o Cine-Teatro e todos os que nele se encontravam. Morpheus e Teloch, dois guitarristas recentes na história de MayheM, cumpriram a sua função e Hellhammer continua no ponto triggado.

Para o final, ficou guardada a fúria de Pure Fucking Armaggedon, com Attila a pontapear as duas cabeças de porco, atirando uma delas em direcção à plateia – nunca a expressão-bengala “remate final” terá sido mais apropriada. Tanto o vocalista, quanto Necrobutcher, despediram-se solenemente do público, mostrando-se claramente satisfeitos pelo tempo despendido em Corroios, no primeiro concerto da banda em solo lusitano.

Foi uma sexta-feira santa.