Há bandas que são, pura e simplesmente, impossíveis de catalogar, tal é a ginástica sonora que conseguem imprimir aos seus instrumentos. Em matéria de elasticidade, os Locrian são mesmo os ginastas chineses do circo da música independente: o seu contorcionismo coloca no sítio qualquer género a que se assemelhe. The Clearing dissipa todas as dúvidas que os seus não-suficientemente aclamados sucessores, Territories e The Crystal World, instalaram nos mais incautos.

Para dizer a verdade, eu próprio fui um dos incautos que se precipitou na densidade dos Locrian e de Territories. Não percebi se o seu som era black, era doom, ou era o mais negro dos drones. Demorei a perceber que os norte-americanos não soam a Sunn O))), não soam a nenhuma banda de USBM e nem sequer que tentam ser os Neurosis ou os Sleep de lado nenhum. Mas passam por tão perto de tudo isso que conseguem agonizar-nos os ânimos como todos os acima citados. E isso, senhores, é o que os eleva ao panteão dos artistas.

The Clearing, em quatro actos, consegue ser perturbador por quatro vidas e carreiras completamente distintas. Num primeiro, com uma abordagem ao doom, seguida de um momento cheio de blast beats, que se perde num devaneio quase Pink Floyd para ser, finalmente, absorvido num drone grave e automatizado. O único ponto em comum, e grande ponto, é a produção lo-fi, que torna os pormenores imperceptíveis. A não ser que se ouça tudo alto. E não há outra forma de se ouvir Locrian.

O novo disco dos norte-americanos é para ser ouvido alto até os ouvidos sangrarem e as músicas dos Locrian não soarem a mais do que ao negro com que vestem as suas músicas. Boas sortes!