Neste segundo longa duração, o quinteto de Michigan embarca numa jornada de descoberta pós-adolescente com contornos emocionais e filosóficos que alarga os seus horizontes musicais. Executado com mestria, Wildlife mostra os La Dispute numa investida post-hardcore tão bela quanto angustiante, em torno de histórias de perda, tormenta e frustração.
Somewhere at the Bottom of the River Between Vega and Altair, de 2008, é um disco de antologia que justificou todo o alarido em torno da banda, misturando a inquietação dos At The Drive-In com a sonoridade dos mewithoutYou. Nesse sentido, por mais bem sucedido que fosse este segundo registo, dificilmente se elevaria perante o seu antecessor. Ao invés disso, Wildlife é mais ponderado, menos explosivo e inquieto. Não traduz um simples esforço de melhoria, de modo reducionista, mas sim uma evolução a partir do que foi feito e a conquista da essência da banda.
Aqui, o poder das canções não provém do seu carácter iminentemente pesado, mas da agressividade e paixão nelas depositada. Por comparação, desde logo se destaca a prestação menos explosiva do vocalista Jordan Dreyer, nem por isso menos intensa, concedendo sabiamente mais espaço aos instrumentos para respirar.
Em vez de reflexões pessoais, as suas letras tomam a forma de poemas ou pequenos contos e, como um actor, Dreyer interpreta a dor dos múltiplos personagens e faz com que a ouçamos mas, sobretudo, que a sintamos. O desespero na sua voz, que oscila entre o spoken word e o grito visceral, tem o mérito de tornar quaisquer conjuntos de datas ou relato de factos absolutamente vitais, estimulando a imaginação de modo cinemático, sob ambientes post-hardcore que a banda edifica. Aliás, as linhas vocais de Dreyer são em La Dispute o factor “tudo ou nada” na apreciação da banda, já que o seu estilo sendo criativo não é propriamente fácil de digerir.
Apesar da evolução musical, Edit Your Hometown mostra um dinamismo punk-hardcore intacto, pese embora a direcção dominante seja mais introspectiva e artística. De resto, o casamento entre beleza e atitude é a marca registada dos La Dispute, espelhada na fúria melodiosa de The Most Beautiful Bitter Fruit. Com efeito, é na segunda metade que a essência do álbum melhor se define e a qualidade dos temas mais se eleva. King Parké inquestionavelmente a pérola do disco, um tema completo e a demonstração clara do potencial dos norte-americanos explorado ao máximo, embora Edward Benz, 27 Times e I See Everythingsejam também pontos altos, tanto ao nível da composição melódica como da escrita.
As três faixas finais soam, de facto, como uma conclusão, um remate final que encerra a obra com naturalidade e harmonia. Snobismo à parte, La Dispute não é para toda a gente, nem a própria banda o desejaria, certamente. Acima de tudo, estes nativos de Grand Rapids trazem ideias frescas ao panorama e são um grupo que parece respirar para a sua arte, com a simplicidade de quem aprendeu a fazer as coisas pelas próprias mãos.
Com Wildlife, dão um seguro passo em frente no seu trajecto: expressivo e conceptual, trata-se de um disco que trilha caminhos de experimentação e que mantém alta a fasquia, formando comParting The Sea Between Brightness and Me, dos Touché Amoré, e Empty Days and Sleepless Nights, dos Defeater, o trio dos melhores trabalhos de 2011 por terras do post-hardcore e arredores.