Pulsações de esguelha, os amargos de boca, a intranquilidade de um Cais Sodré pregado pelos joelhos – não há sextas-feiras santas para King Dude. Elas espalham-se na pelintrice dos loucos, nas hesitações dos descrentes, no balão de whiskey que vai e vem por conta da boémia sem consolo. Ela paga. Morreu-lhe um amigo nesta noite; o King bebe para esquecer e desabotoa a guitarra que só quer respirar: “Jesus In The Courtyard” suspira mentiras numa valsa estrábica. As velas acreditam que estão ali para sempre, mas já vão a meio – como nós. O advento da penumbra espalha-se a cada trote, a cada bagaço acústico que de negro nos confunde o hálito. Oferecem-lhe cigarros de mentol e o King desfaz-se em anémicas elipses de fumo, desalinha-se nas abstracções pagãs que só vestem camisa cor de sombra. Pedem-lhe “Maria”, aconselham-lhe “Barbara Anne”, ele obedece como um velho escritor a quem se exige só outro autógrafo.
A bêbada paixão por Lisboa confessa-se entre salmos de barítono. Tão bonita que ela é a cidade descosida pelo umbigo, arranhada nos braços pelo vento de Maio. “Lucifer’s The Light Of The World” respira naquela lucidez de sótão que apenas a noite conhece, “Born In Blood” tem o baixo volume que os maus da fita usam para adivinhar o fim. A bênção do King não nos salva: encosta-nos à encarnada cruz de pano. Outro cigarro, outro brinde. O baile segue num pasodoble que amarra Death In June à cintura do Mississippi. E eles dançam, dançam sobre a pleura dos mortais, com os calcanhares firmes às palavras que o demónio amassou. “Lay Down In Bedlam” resgata-o para o encore que Lisboa murmura, “Visions In Black” uiva de terror até à despedida. O King esteve aqui.