Jacco Gardner já não é estranho nenhum em Portugal. O que não se toma por tão certo é que, se calhar, nunca o foi. Vindo dos Países Baixos, não foram poucas as vezes que as férias o levaram à quase-savana alentejana, no arredores de Évora, assim como experiências passadas com outras bandas o trariam a palcos portugueses. Assunto a repetir agora.

“Cabinet of Curiosities”, o disco de estreia que o cravou na pop como um novo Syd Barrett, trocada a pintura e a guitarra pelo cravo e o imaginário barroco, é um processo de auto-conhecimento que filtra o peso da reflecção em prol da melodia cativante. É expondo-se alegremente que o holandês acaba por cravar a sua diferença e traçar um etéreo cheio de ganchos, a puxar para o sing-along — o convite fica automaticamente lançado para os concertos de início de semana, apontados para domingo, dia 2 de Fevereiro, e segunda-feira, dia 3, no MusicBox de Lisboa e no Passos Manuel do Porto, respectivamente.

Para começar, há sempre um assunto que parece vir ao de cima quando se fala da tua música — a comparação constante com o trabalho do Syd Barrett. Sentes que as pessoas reconhecem que trabalhas em algo único, ou achas que chegar a esse ponto ainda vai demorar o seu tempo?

Na verdade, as comparações com o Syd Barrett partem de pessoas que não entendem conhecem muito em relação às minhas outras influências,  portanto tento não lhes dar demasiados ouvidos. Enquanto eu mesmo vir as diferenças, não haverá muito com que me preocupar.

O ano de 2013 foi mesmo muito ocupado para ti, com a promoção do “Cabinet of Curiosities” a levar-te em digressão por praticamente todo o mundo. Tens recebido feedback tão positivo nos concertos como em relação ao disco?

Sim, totalmente! Depende bastante de onde tocamos, ainda assim. Há sítios em que se sente que há mais carinho pelo meu tipo de música do que outros. Mas, no geral, sinto que as recepções batem certo, que onde se gosta do disco, gosta-se do concerto.

Mencionaste numa entrevista ao Ípsilon que o teu processo criativo se assemelhava a uma jornada de auto-conhecimento. De que forma é que estar em digressão contribui para isto e te ajuda a compor? Isto é, tens escrito material novo?

Na verdade, é difícil conhecermo-nos quando em digressão, uma vez que estou sempre rodeado por outras pessoas, com quem tenho de trabalhar a tempo inteiro. Não há muito tempo para auto-reflexão, ou para trabalhar em gravações novas. Samplei alguns dos meus instrumentos para usar os seus sons enquanto estiver em tour, mas simplesmente não funciona como uma estadia no estúdio.

Costumas alterar as tuas músicas à medida que te conheces melhor?

Bem, todas as pessoas que conheço e as experiências por que passo acabam por me mudar, e isso reflecte-se na música. E ter começado a tocar mais, a dar mais concertos, mudou imenso a forma como abordo a escrita de canções.

Tu escreveste o single mais recente no teu estúdio, em casa. Trabalhas melhor no teu próprio espaço?

Sim, é onde tenho todos os meus instrumentos e o meu equipamento. Os sons de que mais gosto, precisamente. E quando vou para estúdio preciso de me sentir em casa, para retirar o melhor da experiência.

No ano que passou, tocaste no Milhões de Festa, em Barcelos. Estás entusiasmado para passares para um espaço mais íntimo?

Nunca toquei muito em Portugal, por isso estou mesmo muito curioso. Tive óptimas experiências em Lisboa e no Porto com a minha banda anterior, portanto mal posso esperar.

Portugal não te é nada estranho, contudo. Sentes-te confortável neste lado da Europa?

Sim, os meus pais têm uma casa perto de Évora, por isso acabo por visitar Portugal muitas vezes. Pelo menos, uma vez por ano. Sabe-me sempre bem.

“Cabinet of Curiosities” tem recebido óptimas críticas. Como é que te relacionas com o disco, actualmente? Quão diferente é essa relação da que tinhas com ele quando o lançaste?

Ainda consigo apreciar os sons que utilizei, e as músicas, mas também quero passar para outro tipo de som. O segundo álbum tem estado muito na minha cabeça, portanto já não ouço o “Cabinet of Curiosities”. Também ainda toco as músicas do primeiro disco praticamente todos os dias, portanto ouvi-lo é como um ensaio na minha cabeça.

Quando pensas em lançar o novo álbum?

Ainda não sei precisar. Se tudo correr bem, ainda este ano, por volta do outono. Mas isso pode mudar completamente, entretanto.