Ignorar o suculento arcaboiço imagético presente na noite em questão, torna-la-ia comum como qualquer noite de Bairro Alto. Numa estadia sonora de reduzida parcela humana, quem marcou presença não esperava conhecer uma banda, ou apenas beber um copo no recosto intimista da ZDB. As almas que circundavam o terraço rodeado por muralhas típicas, apenas querem descobrir o que se passa dentro do soloo ou por cima das suas cabeças – ou será, com efeito, o que se passa dentro das mesmas. Os grupos habituais de sirenes estridendes foram na noite de quarta-feria substituídos por uma maioria de solitários taciturnos.

A pequena muldidão desatomizou-se ao soarem os primeiros sinos dos Equations. O projecto português que prepara o sucessor do homónino primeiro álbum, editado em 2012, adiantou no decorrer da actuação pormenores do disco com edição esperada para este verão. O rojo electrónico é mais evidente que outrora e, na sua esfera, uma corrente de instrospecção é oferecida à exploração por riffs apaziguadores, típicos do post-rock, onde se dão choques de groove atentos ao titubear da bateria. Em pouco tempo, as equações de guitarras, groove e tecnologia provocaram reações metafísicas na parca mas, agora, contagiada plateia.

Acarinhados desde a primeira salva de palmas, a banda avançou para o final. Com uma incursão refrescada ao disco de estreia, o quinteto de variadades lunares e musicais cedeu o lugar à atracção da noite. Também um eles um quinteto – na ZDB com a presença de Greg Fox na bateria, Alex Drewchin na voz e equalizadores, seguidos por Turner Williams Jr. na restante e caótica maquinaria. A banda de Brooklyn avançou perante a plateia de quarta-fera na ZDB o recente “Spiritual Emergency”, uma continução em fita inflamável das litúrgicas baforadas de Alex embrulhada numa energia bruta em constante mutação, o fósforo deitado à combustão por Greg Fox; enquanto que Williams, incubido de cinismo de cirurgião e harmonia de maestro, se encarrega de assegurar que tudo está dentro de um espaço e tempo que não são certos.

A distância entre os elementos em palco é pouca, no entanto, esta parece contribuir para a construção de três mundos diferentes. Sobretudo, os que separam Alex e Williams da bateria de Fox. Esta funciona como um grande motor de tudo o que é bom e mau na sua tríade galaxial, num intenso turpor de quedas circulares. Enquanto a voz de Alex produz um transe fantasmagórico e incompreenssível; lança abruptas interrogações existênciais que se devanessem rapido por falta de sentido ou medo. Os convivas, ainda embriagados pelos raios de luz anteriores e pela súbita descida ao subsolo, pediram repenicadamente mais quando se adivinhou o final, retribuindo com piadas à alusão de Greg ao “limão estar já sem sumo”. Conseguindo, com insistência e vontade, arrancar algo que não estava preparado: após indecisão, os três universos voltaram a colidir numa última performance que talvez tenha sido a primeira “tocada ao contrário”, como sugeriu um conviva. Ou então a mesma performance “tocada certa”, uma vez que à primeira poderá ter sido tocada ao contrário”, troçou a vocal do conjunto nova-iorquino de sorriso entredentes.