Um regresso, depois de uma década de ausência, de uma das bandas mais influentes das últimas temporadas da música moderna é algo com que só alguém sem sentimentos consegue lidar calmamente. Não há maneira de ficar calmo, de não colocar as expectativas nos píncaros e de esperar que a música dos Godspeed You! Black Emperor ascenda a esses níveis exagerados – ou, antes, que daí não desça. Para todos os efeitos, esta é a banda que tornou todo o post-rock obsoleto. Sim, porque se aquilo que eles fazem é post-rock, para que servem as outras bandas todas?

O novo disco, com todos os problemas que apresenta – principalmente ao nível da produção – é um engodo. Os Godspeed You! Black Emperor demitiram-se da sua tarefa de promotores das suas capacidades, desistiram da Sociedade do Espectáculo, abandonaram os seus esquemas e a sua indústria. Ou não se atrevem a encarar nenhum destes com seriedade suficiente para investir mais do que os cerca de 50 minutos por que‘Allelujah! Don’t Bend! Ascend! se estende. Mas a sua edição é uma mensagem clara: mesmo colocando oito pessoas dentro de um estúdio a tocar ao mesmo tempo, sem qualquer truque, a banda de Montreal é uma força que só um colectivo pode ser.

Aliás, é esse o único segredo dos Godspeed You! Black Emperor, tão mal guardado que custa ver que as réplicas escasseiam: a coesão, a forma como punks e músicos de escola erudita estão dispostos a exprimir o seu amor mútuo pela humanidade, por Pink Floyd e, por vezes, pelo metal que por aí se faz, e o seu desprezo pela decadência da sociedade moderna, da qual não se subtrai a beleza única do progresso. É nesta dicotomia, potenciada por um colectivo sem egos e cheio de personalidades (membros que se desdobram entre os Silver Mt. Zion, os Fly Pan Am, os Hrsta, os Esmerine e uma data de colaborações incríveis), que se colocam Mladic e We Drift Like Worried Fire. A primeira remete-nos a uns Balcãs destruídos por um genocida graças às suas melodias de origem judaica, e a segunda como repto deste regresso, cheio de esperança para o que se seguirá a uma máquina que parece ter os dias contados.

Se, por um lado, Mladic é um esboço de uma faceta que os demais quatro registos de estúdio nunca transpareceram, com um peso arrastado, quase doomesco, quase metal, mas sempre GY!BE, a tomar a música de assalto depois do seu bailado para o mais épico casamento, sobreposto com um bar mitzvah em pleno hanuka; We Drift Like Worried Fire seria, por seu lado, quase uma música de post-rock clássico, exemplo perfeito de algo que podia ter integrado um Lift Your Skinny Fists Like Antennas to Heaven, entre a alegria extasiante do género e a angustia única da banda de Montreal, não fosse o regresso à agonia única do colectivo do Quebec, que nos leva até ao final da música com um baixo a agarrar-nos o pescoço com a sua harmonia, depois de roubar a música ao violino.

Em suma, as músicas dos Godspeed You! Black Emperor estão saudáveis, estão poderosas como sempre – até porque não são novas, já fazem parte dos alinhamentos da banda há largos anos. Contudo, ‘Allelujah! Don’t Bend! Ascend! não faz jus à capacidade orquestral das suas composições e há que culpar a produção disso. Ou, antes, fazer vénias à salutar vontade que eles têm de deixar a sua marca, mesmo que seja ignorando todas as regras e os bons costumes. Não interessa de que forma as coisas singram na indústria, os God’s Pee vão continuar a insurgir-se pelos seus próprios meios, nem que seja a gravar o seu disco punk.

Os Godspeed You! Black Emperor lançaram um bootleg do concerto que deram no estúdio e, mesmo assim, continuam a ser melhores do que todas as outras bandas de post-rock. Ou resolvemos isto com um género novo para os canadianos (só para chatear) ou começamos a declarar austeridade na concorrência e para ela morrer rapidamente, i.e., usar o método “Vítor Gaspar”.