Na antecipação do concerto dos God Is An Astronaut, tínhamos dito que haveria duas novidades fundamentais em relação à passagem por Paredes de Coura 2012: a presença de projecções de vídeo, que os problemas técnicos da altura não permitiram, e a apresentação do novo disco Origins. Pois bem, quando, uma hora do espectáculo, ouvimos Torsten Kinsella dizer que a parte visual já não existe porque a consideraram supérflua, foi como se nos partissem o coração. Nada como respirar fundo e lembrar-nos que, passado o desapontamento, o espectáculo do festival minhoto foi bem bom. Pode não ser uma viagem sensorial no seu esplendor, mas continua a ser uma viagem com muito nervo e emoção.
A abrir, estiveram os Quelle Dead Gazelle, duo português de guitarra e bateria, que faz lembrar uma espécie de versão menos matemática e em início de carreira (calma, eles ainda não são assim tão bons) dos Battles. Alternam momentos muito arrastados, quase doom, com outros em que uma guitarra bem gingona submerge, entre um Deixa-me Ser dos Paus e algo levemente africano. E, vai daí, há um tema chamado Afrobrita. A parca e tímida comunicação do baterista com o público soa a oportunidade perdida, mas este compensa com uma entrega às percussões que resulta num bom aperitivo para as estrelas da noite.
Se falhámos na primeira previsão da noite, na segunda não havia como. A banda irlandesa veio apresentar Origins e fê-lo em doses bem mais reforçadas do que nas anteriores digressões com os novos trabalhos. A abertura fez-se precisamente com dois dos temas novos, com a componente épica de Weightless e a primeira marca sintetizada com Transmissions. Se confirmamos a ideia que este novo disco é bastante recomendável e diverso, sentimos que as imagens vão fazer falta. Especialmente porque o espaço TMN ao Vivo está longe de ser perfeito, com um décor discutível e demasiada luz (já para não falar da música brasileira que recebeu os espectadores no momento de abertura de portas), e porque essa ausência não foi compensada com uma iluminação consistente.
O novo disco tem a particularidade de introduzir com muito mais regularidade a voz, através de vocoders, funcionando como um instrumento adicional. Sinal de uma banda que gosta de se reinventar, esteja ou não no post-rock e derivados. Nesse campo, há Exit Dream ou Calistoga, que vai da catarse à Batcat dos Mogwai até uma espécie de refrão que toca uns pozinhos no electro-pop. E, em registos diferentes, há um sintetizador altamente dançável em Spiral Code que contrasta com o lado simultaneamente bonito e triste de The Last March, dedicado a uma série de fatalidades que familiares da banda sofreram. Talvez seja, como um todo, um disco mais melódico, mas é curioso perceber que a banda continua mais poderosa em palco, confirmando o que demonstrou no ano passado, fruto da entrada de dois novos elementos e de uma/duas guitarras adicionais.
Alternando com os temas novos, houve regressos inevitáveis ao passado, com destaque para a força renovada de Echoes e para as habituais incursões pela obra-prima All is Violent All Is Bright.São quase sempre presenças obrigatórias a candura do teclado espacial de Forever Lost, a beleza incansável de Fragile (será possível não ficar arrepiado?) e o viciante Fire Flies From the Empty Skies, que levou ao rubro a plateia. O post-rock não tem que ser só cerebral e os God is An Astronaut mostram isso de uma forma particularmente simpática e contagiante, desde o espírito muito aberto e conversador nas entrevistas, como pudemos confirmar antes do espectáculo, até à empatia com o público (e, caso se queiram rir um pouco, peçam ao teclista para tentar dizer umas palavras em português).
Para o encore, ficaram lado a lado o clássico e a estreia, Suicide by Star e Red Moon Lagoon, acompanhados de um pedido de energia especial para superar Amsterdão como o público mais entusiasta. Por outro lado, Torsten tinha apostado connosco que o novo tema era capaz de ganhar na comparação com o mais antigo. Tudo é discutível, mas que importa? Até porque o mais frito Route 666tratou de cilindrar os resistentes. Para quem viu a banda há 4 anos, quando ainda eram apenas um trio, facilmente reparamos que os God is an Astronaut estão com maior capacidade de improvisação, com mais alma e mais descontraídos em palco. Numa palavra, mais consistentes. Quando assim é, teremos coragem de voltar a falar na parte visual?