Por Santo Tirso, cidade que declaram «vil no bom sentido», os Gesso são donos do seu tempo artístico. Ao frenesim psicadélico que caiu sobre Portugal, respondem com a segurança de quem não faz só por fazer e de quem não toca só para fazer de conta. A poucos dias de descerem até Lisboa para actuarem no Festival Rescaldo, falámos com o guitarrista Joel F. a fim de medir o pulso aos Gesso de 2015.
Antes de tudo: porquê o nome Gesso?
Gesso é uma expressão usada por nós, mesmo antes da formação da banda, para definir um som espesso, compacto e poderoso que fosse transmitido por alguma banda que assistíssemos. Então se acabava por dizer “Isto é grande gesso!”. Curioso que existem também outros tipos de expressões que fomos descobrindo. Como por exemplo, em Viseu, gesso é um copo de vinho bruto.
São vários aqueles que vos definem como stoner. Essa designação, e esse nicho rock, têm algum significado concreto para os Gesso ou acaba por ser algo puramente abstracto?
Embora o som de Gesso talvez transmita sem rodeios esse estilo stoner, e é perfeitamente legitima essa definição, acaba por ser puramente abstracto para nós. Digo mesmo que acabou por ser um acidente, porque na verdade, cada um de nós, tem uma escolacompletamente distinta destes géneros e há distinção entre os nossos verdadeiros gostos. Posso até dizer que foi meio aventurado introduzirmo-nos nesse tal nicho de rock. Acabámos por conhecer bandas dessas ondas que nunca ouvimos falar e, conforme o tempo, começámos a apreciar, muito após o nascimento de Gesso. Mas nunca rotulamos o que fazemos, nem devemos, porque na verdade haverá sempre mudanças, seja de que forma for. Faz parte da evolução das coisas.
A verdade é que há muito que a música psicadélica não tinha tamanha expressão em Portugal. São várias as bandas que nascem orientadas por essa amplitude e os festivais psych multiplicam-se. Crêem que há público suficiente para absorver esta profusão?
Acho que sim. Nestes últimos anos tem havido um pico gigantesco destas ondas psicadélicas, seja de bandas, editoras, promotoras, eventos, etc. O público vai descobrindo, vai junto e crescendo, principalmente a camada mais jovem. Portugal entrou no arrastão que há na Europa, por isso agora temos grandes festivais comoReverence e Sonic Blast. Se calhar a juventude, perante as situações socio-económicas/politicas/modos de vida/ etc., está mais sensível nesta altura. Os escapes que se vêem hoje em dia talvez sejam muito mais expressivos do que em alturas de maior estabilidade nas sociedades. Calhou ao psicadelismo, algo que já não é novidade se espreitarmos um bocado o passado.
E como vocês descreveriam o percurso de Gesso dentro desta febre? Sentem que, desde 2011, têm aumentado as oportunidades de tocar ao vivo e há uma maior receptividade ao vosso som?
Tivemos bastantes concertos no início, porque era o início. São como as paixões, são intensas mas curtas. Depois vêm as relações. Após isso, os concertos foram diminuindo porque também preferimos assim, e continuamos a pensar dessa forma e de maneira mais madura, e do que é melhor para nós. As receptividades foram diversas: houve alguns bons feedbacks fora de Portugal, dentro do país já foi mais dividido. Se fizemos parte da chamada febre, epá, houve alturas para tudo, mas se calhar somos um dos mais marginais em relação a isso. Santo Tirso é vil, no bom sentido. ☺
Quando olhamos para uns Black Bombaim, cujas tours Europa afora se sucedem, vemos que as oportunidades para tocar lá fora existem. Têm esse objectivo com os Gesso?
Existem quando são bem pensadas e bem planeadas. Existe também um nível de ascensão minimo/limite para atingir esses patamares, como Black Bombaim já tem, por exemplo. Não vou dizer que nunca pensámos, porque acaba por ser um objetivo claro para qualquer banda que se preze em querer ser boa e que tenha amor aquilo que faz. Mas o futuro dirá, e vai dizer de certeza nem que seja com páginas trocadas, frases ao contrário e por metáforas.
Vocês, até ao momento, trabalharam apenas com editoras nacionais. Já tentaram, ou pensam tentar, meter o vosso trabalho lá fora, contactando labels e/ou apostando em agências PR?
Não contactámos, mas contactaram-nos uma vez: uma editoraundeground holandesa chamada Vlinder Tapes, que como o nome indica, lançava tapes. Chegamos a fazer um acordo para um lançamento limitado de algumas cópias, mas acabou por não ir para a frente porque declarou falência e fechou por falta de fundos. De resto, foi-nos dado o suporte de divulgação pela Capote Música, ZigurArtists e Noir et Blanc, mas as edições acabaram por ser nossas. Tanto do EP como do álbum, ambos trabalhados com suor de inicio ao fim pelas nossas próprias mãos.
Dois anos passaram desde “Howling Grace” – uma eternidade no tempo online. Estão já debruçados sobre o próximo disco? Alguma novidade que possam adiantar.
Posso adiantar que o que vem daqui para a frente já está debruçado e é risonho. Assim nós esperamos.