23:20h, fim da versão apoteótica de “Two Steps Twice” (o tal que, no Alive 2011, a banda foi impedida de tocar). O público aplaude euforicamente, entoa de forma frenética o “pa-pa-ra-pa-pa-ra; pa-pa-ra-pa-pa” que acompanha uma parte do tema e pede ansiosamente que os Foals regressem a palco. Sem efeito… as luzes acendem-se pouco depois e confirma-se uma sensação algo agridoce: foi muitíssimo bom, mas foi curto. Contudo, prevalece o ímpeto mais positivo e, convenhamos, após “Two Steps Twice”, já nada faria sentido.
Duas horas e tal antes, sobem a palco os Everything Everything. Vamos ignorar o nome e o estilo meio parolos e vamo-nos concentrar na música. Entre guitarrinhas e teclados indiferenciados e uso e abuso (passando todos os limites) dos falsetes e das harmonias vocais mais duvidosas, andam algures naquele pacote de bandas onde estão os Friendly Fires, os Two Door Cinema Club ou os Citizens!. Gente que pode animar a malta, mas que não fica minimamente na história (embora haja surpresas, umas mais agradáveis que outras). Deixam elogios ao público, à beleza do coliseu e aos Foals que os convidaram. Em troca, obtêm uma considerável receptividade do público, em bom número para a primeira parte. Convertidos à partida ou na hora, esse mérito ninguém tira aos Everything Everything.
Minutos depois das 22h, luzes amarelas e azuis a provocar encadeamento e uma batida entre o sinistro e o épico servem de rampa de lançamento para a entrada em palco dos Foals. Depois, lentamente, entra a primeira linha de guitarra de “Prelude” e sente-se o primeiro arrepio. A entrada instrumental em crescendo, de acordo com a óptima intro do último disco, é o mote para um grande concerto.
Tal como era previsível, Holy Fire domina o alinhamento, o que, seguindo o que sucede no disco, poderia indicar uma maior irregularidade,. Mas isso está longe de acontecer. Não só porque as escolhas incidem no melhor do álbum, mas também porque as versões ao vivo são globalmente felizes. “Inhaler” e “Providence” (dedicada ao que é ser um animal) mostram, de forma catártica, o lado rock mais abrasivo da banda britânica; “Late Night” tem uma entrada ao piano lindíssima e um final ambiental com solo de guitarra sem virtuosismos excessivos; “My Number” provoca a loucura generalizada, ampliada pelo som muito grave inicial, antes de irromper a guitarra gingona. Se há dois anos ficámos surpreendidos com a legião de fãs que os Foals tinham, agora vemos público a cantar de cor e salteado os novos temas (e a receber de forma um pouco menos conhecedora os restantes) e percebemos como ganharam entretanto um novo público.
Os regressos ao passado dividiram-se pelos dois discos. De “Total Life Forever”, houve o tema título e a beleza melancólica de “Blue Blood” e principalmente de “Spanish Sahara”. Continuam a ser temas lindíssimos, principalmente o segundo, coisa absolutamente arrebatadora ao vivo, entoada em coro e só parcialmente estragada pelas palmas ridículas do público, num tema que exige alguma celebração contida. De “Antidotes”, para além do já referido “Two Steps Twice”, houve “Olympic Airways e o inevitável “Red Socks Pugie”. Este último não poderia soar mal, mas o arranque pareceu demasiado lento e floreado, quando se pedia algo mais cru e directo para lançar o refrão previsivelmente eufórico. É o risco necessário de uma banda que não tem medo de alterar um pouco os temas ao vivo, mas sem os descaracterizar e conjugando na perfeição os momentos mais lentos com as loucuras colectivas. Quando assim é, aceitamos sem problemas a ausência de comunicação com o público, sendo esta praticamente apenas corporal, como sucedeu quando o vocalista Yannis Philippakis irrompeu pela plateia.
Outro dos aspectos de realce são as luzes, que cumpriram na perfeição o seu papel de combustível emotivo. Sem excessos ridículos e sem se sobreporem ao impacto sonoro, conseguiram um equilíbrio requintado nas cores e entre os focos frenéticos nos momentos mais caóticos (como em “Providence) e a quase ausência nos períodos mais suaves ou ambientais (como no arranque de “Late Night”). E, com pequenas luzinhas brancas em todo o espaço do Coliseu, fecharam em grande na versão mágica de “Two Steps Twice”. Uma versão longuíssima, jogando na perfeição com o lado mais ska do tema e manipulando o ritmo de forma sublime.
Sentimos inevitavelmente a falta de mais Foals das raízes, de uma certa crueza emotiva, musicalmente entre o rock e o tal ska, com qualquer coisa dos Morphine, que dominava “Antidotes” e os primórdios da banda. Faltaram temas que têm feito parte dos alinhamentos, como “Electric Bloom”, “Balloons” ou o mais velhinho “Hummer”, um dos primeiros singles da banda. E uma hora e um quarto de concerto foi realmente curto. Coisas menores, pequenos aspectos que não beliscam a intensidade do que se ouviu. O Coliseu rendeu-se justamente aos Foals e esse é o dado a reter.