Para deixar tudo em pratos limpos, adianto já que não se viram metaleiros suficientes na plateia do Coliseu do Porto para que Feist sacasse do seu bacalhau e começasse a tocar Black Tongue, dos Mastodon. À falta de pedido, a cantautora canadiana ficou-se pelas duas horas e vinte minutos de concerto, três encores e uma atitude rockeira de não envergonhar de forma alguma o seu compatriota Neil Young. Aliás, para os lados do oeste longínquo, tão presente no imaginário do guitarrista de Toronto. Mas, primeiro, vamos a Metals.
Depois de uma morna primeira parte de , em que a voz adocicada do cantor, acompanhado somente pela sua guitarra, não se conseguiu sobrepor ao burburinho de excitação em torno do regresso de Leslie Feist ao Coliseu do Porto. E que regresso.
A autora de Reminder acusou, desde o início, o cansaço na voz, mais rouca do que aquilo a que sua natureza cristalina nos habituou, contudo, não foi isso que a travou de proporcionar uma actuação em que o protagonismo acabou por ser dividido com a audiência, insaciável, a exigir três regressos ao palco depois de terminada a fase dita regular da actuação da canadiana e a satisfazer os seus desejos de requinte – que envolveram coreografias, inquéritos vocais e tudo o que se possa imaginar a audiência a fazer. Faltou-lhe, apenas, o toque de maestro à Frank Zappa para ser dispensada do seu papel de entertainer, como quase aconteceu aquando do seu segundo encore, em que enquanto afinava a guitarra cantou uma das canções do seu reportório com a audiência. Azar dos azares para os que já se encontravam na fase “discos pedidos”, essa ficou riscada da setlist e deu-se lugar a Secret Heart.
Tiremos, ainda assim, o chapéu perante Feist, que não se coibiu, de forma alguma, de marcar bem o tempo da sua actuação, tão bem oleada que até os pregos, os enganos e os indisposições do acaso pareciam preparadas ao pormenor – ou, estava a meninaLeslie tão à vontade, que tudo fluiu conforme desejou. Com o seu lado mais rockeiro em evidência, e sempre com a guitarra a tira-colo, cedo a canadiana apresentou o seu bacalhau e se atirou às malhas mais fortes do novo álbum, momento pontuado com A Commotion e as suas dinâmicas de extremos. De lado, até ser esgotado o seu reportório nas extensões do concerto, ficaram as canções interpretadas apenas pela sua guitarra, visto que a banda esteve sempre presente, e bem, durante a sua actuação.
Feist voltou a Portugal para oferecer, simpaticamente, o melhor alinhamento possível, dentro de uma carreira que não tem, de forma evidente, nódoas. Contudo, mesmo as canções menos “branquinhas” ficaram de forma – ou as que não ficaram foram sujeitas a um tratamento de choque para subirem a parada até ao nível das demais. The Bad In Each Other mostrou que a canadiana sabe assumir os seus erros e colmatá-los em concerto, mas foi o seu dueto com a bateria, com o seu amplificador Fender a sofrer de reverberação, que levou a audiência, sempre rendida, até aos tempos mais psicadélicos de Neil Young e me fez pensar que a Anna Calvi ainda é uma menina. Resumindo, não é a Suíça, nem tampouco o Homo que lavam mais branco: é Feist, que não leva máculas para os seus concertos.