A música surge muitas vezes associada a momentos íntimos e pessoais. De facto, poucos serão aqueles que podem afirmar que a interiorização e apego a certas situações musicais, não estejam claramente relacionados com diversos estados de alma. Contudo, outro factor não poderá ser esquecido como importante na apropriação musical de maneira singular e específica, ou seja, a forma como se encara qualquer propriedade exterior na recepção da mesma.
Assim, com a atitude descontraída e serena com que se apresentou na Galeria ZDB, Eleanor Friedberger ousou interpretar um conjunto de temas que se tornaram um enorme corolário para o término de um dia veraneio, adaptando perfeitamente a pop orelhuda, mas extremamente suis generis às condições temporais.
Com os Fiery Furnaces temporariamente em descanso para, não só Eleanor como o seu irmão Matthew prosseguirem com as suas carreiras a solo, o concerto servia de apresentação ao álbum editado no ano passado, Last Summer. Tal como no citado lançamento, é com My Mistakes que começa a actuação. Acompanhada por outros três músicos, logo se entende que ao vivo os temas são instrumentalmente mais fortes e destinados a uma maior predominância das duas guitarras. No entanto, a voz consegue soar constantemente num alogaritmo estranho entre a distância e a proximidade, notando-se um carácter apaixonante e quase sedutor. Obviamente, não era esse o objectivo, mas a pura verdade é que dessa forma que se pronunciou ao microfone.
Com o intuito de não se restringir apenas a temas do longa-duração, é com Bother e I’ll Never Be Happy Again que se começa a conhecer um pouco daquilo que será o futuro, mostrando que se poderá esperar uma sinergia entre blues, rock e jazz com a constância da postura vocal suave.
É com Roosevelt Island que se sente novamente o calor tropical dos instrumentos e da voz da natural de Chicago, mostrando que estaria escondida atrás da sua banda uma excelente compositora que, conseguiu embarcar em letras muitas vezes melancólicas, mas com uma componente alegre e divertidas estruturas.
Ao longo de todos os minutos em que Eleanor esteve em palco, aquilo que foi conseguido centrou-se numa espécie de exorcização de grandes males, mas que acabaram por ser transformados com bastante sucesso em pequenos retrocessos.
Antes de se retirar definitivamente, surge em palco apenas com a sua guitarra e com o bater constante das botas de cowboy, interpretando One-Month Marathon e uma versão acústica do tema Dallas de Jimmie Dale Gilmore. Apesar disso, é quando regressa toda a banda que se percebe que acompanhada o sucesso é ainda mais grandioso.
No momento da despedida, o que acaba por transparecer é que, se os Fiery Furnaces tiveram que entrar num interregno, pelo menos no respeitante a Eleanor, bendita foi essa decisão.