Com apenas cinco datas anunciadas para a tour europeia, o Le Trianon foi um dos felizes contemplados com a passagem do super grupo norte-americano. Se por um lado o apoio da “3030 Orchestra” era um privilégio parisiense e londrino conhecido à priori, o misto de live act com dj set de Kid Koala para aquecer a sala foi uma total surpresa. Numa altura em que o público ainda estava a instalar-se, o canadiano deu uso ao habitual trio de Technics SL-1200 para fundir os universos díspares habituais no seu trabalho através de uma capacidade técnica que não encontra detractores e abre o scratch a novos públicos. Trocado por miúdos, rap óbvio, samples obscuros, música infantil e o cancioneiro afro-americano dos estados sulistas dos EUA forçados a conviver entre si através da manipulação do tempo, de crossfaders e de uma, duas ou três rodelas de plástico preto escrupulosamente organizadas. Um must que ganha ainda mais sabor por incluir pelo meio a dança do programa “Yo Gabba Gabba” e por acabar com a versão de Audrey Hepburn de “Moon River”. Dois standards das actuações de Koala altamente representativos da excepcionalidade do canadiano.
Pausa de 15 minutos, ao longo dos quais vai ficando sucessivamente mais difícil ganhar terreno às filas da frente. Entram os 16 elementos da orquestra ordenada e discretamente. Entra o baixo e a bateria. Reentra Kid Koala. Entra Dan The Automator, maestro para o resto da noite. E, previsivelmente em último, Del The Funky Homosapien. Com circunstância, sem pompa.
Registos conceptuais, quando tocados ao vivo, correm o risco de perder a força que a sequência programada em estúdio lhes confere. Contudo, ainda que conceptual, Deltron 3030 enquanto projecto não se equipara a um “Prince Among Thieves” (Prince Paul) ou a um “The Death of Adam” (88-Keys). As letras que Del The Funky Homosapien imaginou em 2000 (“Deltron 3030”) e 2013 (“Event 2”) são intercaláveis. A cronologia que rege o projecto começa em 3030 e daí em diante não obedece a uma estrutura narrativa rígida. “Event 2” centra-se em 3040 mas a diferença que 10 anos fazem nesta distopia é marginal se comparado com o salto de 2000 para 3030. Daí que a opção da primeira metade do espectáculo em combinar os momentos altos de cada um dos dois albums não enfraqueça o conceito subjacente nem condicione o usufruto do mesmo. Isso significa “Mastermind” ou “Positive Contact” (do primeiro registo) no meio de “The Return” ou “Nobody Can” sem acusar qualquer tipo de incongruência.
Se durante os momentos iniciais a orquestra de apoio passou algo despercebida, quando “Event 2” passou a ser o foco definitivo da noite a “3030 Orchestra” pôde então brilhar. Esse brilho pouco deveu à condução do maestro. Dan The Automator, responsável maior pela construção da ambiência que povoa os dois longa-duração do super grupo cingiu a sua acção na qualidade de maestro a um movimento básico e insignificante aperfeiçoado num loop de sessenta minutos. A orquestra provou não necessitar dos seus préstimos para dar uma dimensão mais apocalíptica e épica às letras de Del. E “City Rising From The Ashes” provou ser o melhor expositor das qualidades da orquestra, de onde a secção de sopro e o quarteto que compunha o coro mais se destacaram.
Dan The Automator enquanto improvável mestre de cerimónias (MC), provou ser mais competente. Entenda-se: Del faz o que tem a fazer quando o tem que fazer. Rima o que tem a rimar e retira-se. Mas tanto cede o protagonismo aos restantes elementos da banda que acaba por não interagir com o público. É essa ponte queThe Automator assegura. Esse distanciamento de Del pode deixar a audiência com fome, mas não se traduz numa exibição mais desfalcada. Antes se distribui a atenção por tanta coisa de bom que as mais de duas dezenas de músicos em palco vão fazendo, provando que está montado um espectáculo que goza de um equilíbrio muito bem afinado. Fica a dúvida se é a mesma sensação que terá quem estará presente nas datas que não incluem o suporte da “3030 Orchestra”.