Enquanto a cidade do Porto recebia uma imensidão de gente, por causa do cortejo da Queima das Fitas, o Hard Club recebia uma pequena multidão, reunida sob o propósito de desejar as boas vindas ao trio de rock mais ébrio, pesado e groovie a aparecer do lado de lá do rio grande, como diriam os cowboys. Sim, foi mesmo uma noite de southern rock para todos os gostos; os Dead Meadow têm essa capacidade de sintetizar as suas muitas sensações.

Antes, no entanto, actuaram os companheiros de digressão dos Dead MeadowSpindrift, com o seu rock claramente roubado do country. O quinteto teve a capacidade de virar a sala 2 num Texas – e isso não é exactamente perfeito. Norte-americanos, sulistas de gema, só não levaram os seus seis-tiros para o palco provavelmente porque já devem ter tido problemas com isso no passado, mas fizeram questão de não deixar mais nenhum acessório de fora, desde os chapéus às interjeições típicas, como a clássica “iiiiihaa!”.

No fundo, as semelhanças com o colectivo de Denver, Colorado, liderado por David Eugene Edwards, os grandes Wovenhand, eram claros, desde a presença óbvia do folk até à incorporação de alguns elementos dos nativos norte-americanos, sem esquecer uma componente incontornável de psicadelismo, em muito devida ao lap steel e ao reverb carregado do guitarrista-vocalista da banda. Contudo, onde osWovenhand ganham em mestria, com todos os ingredientes a fluir na sua receita, os Spindrift perdem em exagero. Mas, verdade seja dita, arrancaram-nos um sorriso a todos, e isso é o que importa.

A noite devia ter começada com os copos, faça-se-lhe justiça. Aproveitava-se a boleia da batcave ambulante em que a Invicta se tinha transformado para trazer à flor da pele o lado mais dançante de todos os nós e, dessa forma, os Spindrift teriam sido verdadeiros reis da festa. Chegada a vez dos Dead Meadow, a decadência tomaria conta de nós – o trio faria o resto na nossa cabeça, com o seu resumo completo do southern rock na sua versão mais dopada.

Começaram por relembrar os OM, com o seu recurso introdutório à cítara indiana e ao seu som transcendente-meditativo, para logo se iniciarem, com o pé esquerdo, acrescente-se, a sua sessão de riffs adornada de rasgos, ou, antes, pequenos golpes de costura, sensível, tão à moda do indie rock.

Iniciando a actuação de forma pouco segura, em muito motivada pela decadência a que tresandavam, os Dead Meadow protagonizaram alguns tropeções, suficientes para inspirar desconfiança – rapidamente dissipada. De peito cheio e cabeça erguida, puxara pelos graves, pelos solos e pelo balanço todo que caracteriza a sua música para embalar a audiência ao som de What Needs Must BeSleepy Silver Door e de umas quantas jams de duas partes – a do guitarrista, absorto nas suas próprias melodias, e a do baterista e do baixista, que iam brincando com os tempos, desmontando-os e dificultando as suas vidas mutuamente, sem nunca as tornar impossíveis –, até que a resistência oferecida às suas canções substanciais se revelou nula.

Já em encore, um monstruoso e lento monte de pelo, à moda de uma grande personagem de Jim Henson, subiu ao palco para se arrastar em vez da audiência – que agradeceu fervorosamente o esforço.

Podem não ter começado da melhor forma, mas os Dead Meadow depressa se recompuseram e mostraram-se ágeis no manuseamento não só dos seus instrumentos, mas de todas as texturas da sua música, com um baterista certo e dotado de uma invejável capacidade de complicar os seus breaks sem se perder, e com um baixista à moda de Cisneros e com uma noção de tempo imaculada. O guitarrista? Encantou as miúdas que estavam presentes com a sua voz melosa e sofrida, enquanto saciava as necessidades mais viris da audiência com verdadeiras descargas de gravidade sonora tão à moda de um bom stoner. É tão compreensível e nítido onde é que os Dead Meadow não estão mortos.