“É engraçado, normalmente ouves dizer que as bandas vão ficando velhas e perdendo a agressividade, mas eu nunca encontrei qualquer razão para não andar furioso. Este disco não é diferente.” Jacob Bannon
É contra natura o facto de os Converge ainda existirem. Num ADN cujo principal elemento é o punk hardcore, vinte e dois anos de vida seriam mais do que suficientes para oxidar o móbil desta banda: a raiva. O cair do pano mais sentido faria depois de já terem atingido o estatuto de lendas e de terem lançado um disco que, por algumas publicações especializadas, é somente o imperador da primeira década do novo milénio – Jane Doe. Ou poderiam simplesmente vaguear por aí a viver dos rendimentos da sua era dourada, seguindo o decadente exemplo de tantas outras bandas ditas referência. Todavia, há uma qualidade que o quarteto nunca dispensará, e até está bem reflectida no nome de um grupo que certamente os inspirou a começar tudo isto: integridade.
Se em 2012 há um novo álbum de Converge (por sinal, o oitavo), é porque há algo a ser expurgado. Noutras alturas, as desventuras românticas e a violência proveniente dos “broken hearts”, comoJake refere em Aimless Arrow, serviram de motivo-mor para as autoflagelações em palco e em estúdio. Agora, fruto da idade, temos um vocalista que se sente anacrónico e culpado. Anacrónico por estar a caminho dos 36 anos e militar num cena que respira juventude; culpado por ter sacrificado amizades, laços familiares e até animais de estimação – a morte da sua cadela, com quem não conseguiu passar os últimos dias, marcou a temática deste disco – em prol de um sonho atingido.
Se a temática é um factor crucial num disco de Converge, a outra obviamente faz-se da música. E, sem desprimor para Nate Newton, que é um baixista notável, quem tem Kurt Ballou e Ben Koller tem tudo o que é preciso para lançar um grande disco extremo. Estilisticamente, o que encontramos em All We Leave We Love Behind é uma linha que vem sendo seguida desde No Heroes: o inferno rítmico (possivelmente traduzido como mathcore) já não detém o papel principal como o fazia até You Fail Me, concedendo o seu lugar a uma rispidez que está sempre lá, mas que se mune desde 2006 de uma cadência mais linear. As variações não se fazem com abruptas mudanças de ritmo, mas com riffs que surpreendem pela sua novidade (Sadness Comes Home) e principalmente pela multiplicidade de influências e estilos.
Apesar de o disco fluir sem obstáculos, não se encontram duas malhas iguais. Temos crust em Trespasses e encontramos sludge em Empty On The Inside (que conta com uma impecável mid-section, patrocinada por um Bannon em modo spoken word). Temos uma perturbante e dissonante atmosfera à Starkweatherem Glacial Place e deparamo-nos com um punk hardcore capaz de lembrar Ceremony ou Negative Approach em Vicious Muse. Temos momentos mastodónicos em Coral Blue e descobrimos uma brilhante combinação feita por Precipice e All We Love We Leave Behind, naquele que é provavelmente o apogeu de todo o disco. Por tradição, as faixas de Converge que partilham o título dos álbuns assumem-se como pináculos de intensidade e AWLWB não compromete o cânone.
Tudo isto num registo gravado como se de um concerto ao vivo se tratasse, no GodCity Studios de Ballou. Daí que a bateria de Ben Koller transpire e sangre punk como há muito não se ouvia e que a compressão seja bem menor em comparação com Axe To Fall. Também não há convidados especiais: All We Love We Leave Behind é exactamente aquilo que os Converge são em 2012, sem apetrechos, ornamentos e atavios. Apenas um talento interminável, uma sinceridade ímpar e uma inesgotável paixão pela arte.