Quando se fala nos inícios da década de 80 a primeira banda a destacar são os Joy Division. Sem eles as portas do mundo mediático não se teriam aberto para o Post-Punk – e muitas bandas que surgiram nessa altura lhes devem isso. Os Bauhaus estarão sempre em dívida para com a banda de Ian Curtis e sabem como prestar as devidas homenagens (recorde-se que na edição de 2006 do festival Paredes de Coura os britânicos fizeram um cover da músicaTransmission). Mas não será por terem uma dívida que estes senhores não se tornaram ‘cobradores’ de todas as bandas que se enquadram no Gótico; sem um In The Flat Field ou um Mask, a música não conheceria o lado negro, teatral e irónico que só os Bauhaus lhe conseguiram dar. Bauhaus, como todos deviam saber, era uma escola de arte e design que foi encerrada pelo regime nazi e que representou uma vanguarda artística importantíssima. Não se pode dissociar este conceito da banda de Peter Murphy, que pegou no que já se tornava repetitivo e criou toda uma nova estética musical. In The Flat Field, reunindo letras tão lógicas que são um gozo autêntico da realidade e uma musicalidade constrangedora de tão singular, tornou-se um exemplo perfeito dessa estética protagonizada por uma banda de vanguarda em tempos de reinvenção sonora – uma tarefa complicada, que os Bauhaus realizaram.
O início do álbum não pode servir de melhor introdução: Dark Entries é um óptimo tapete de entrada para o resto do álbum, que segue com uma Double Dares, em que nem o baixo, tão típico de Joy Division, consegue suplantar aquela bateria desorganizada, que parece estar sozinha na música, ainda que seja o acompanhamento perfeito todo o ambiente criado; e é com In The Flat Field, precisamente, que a verdadeira faceta lírica de Peter Murphy vem ao de cima, quando este canta “I do get bored in the flat field” – não é possível haver uma frase mais factícia que esta, e estou para conhecer o piloto de Rally que discorde. Tudo o que vem depois destas três músicas faz todo o sentido, desde God in na Alcove aTerror Couple Kill Colonel. As faixas assaltam-nos através da voz teatral e bipolar deMurphy, que tanto é grave e polida como arranhada e esganiçada, da guitarra psicadélica e saxofone solista de Daniel Ash, do baixo pós-punk de David J. e da bateria tribal quase sem pratos de Kevin Haskins.
É esta simplicidade instrumental e interpretativa que dá tamanha eficácia à música dos Bauhaus, que adquire proporções pouco naturais. A estranheza que os britânicos criam de imediato em nós não deriva só do facto de a música ser muito negra, mas também por esta carregar uma grande teatralidade que nos assombra durante todo o álbum (e que se nota ainda melhor ao vivo, com todo o aparato que esta banda faz parecer muito natural).
O ambiente de In The Flat Field é assustador como a realidade pintada de preto que os Bauhaus representam tão bem através da ironia e da teatralidade que as músicas têm. Mas assim que nos habituamos ao que ouvimos também nós estamos de negro, pois, admita-se, ainda hoje não se faz música assim, e é raro o álbum que contagia tanto quanto este.