Estou tentado a dizer que é de rock que se trata, mas desde bem cedo na audição do disco homónimo e debutante de Chelsea Light Moving, Sleeping Where I Fall, que Thurston Moore e companhia mostram não ser um spin-of daquilo que eram os Sonic Youth – como, de resto, tem feito Lee Ranaldo, na sua mais recente incursão em nome próprio. Moore está numa crise de meia idade, mas isso parece dar os seus bons frutos: Chelsea Light Moving preenche o espaço que separava os seus riffs de outros terrenos musicais, representando uma expensão de frescura no percurso do norte-americano. Invariavelmente, neste disco aquele que é um dos rockers mais adorados pela cultura indie anda pelas paragens mais pesadas.

Não há equívocos, contudo, no que diz respeito ao som de guitarra: cada malha tem um cunho inconfundível do ex-Sonic Youth e as comparações com a sua banda maior não serão poucas, nem infundadas. Mas, rapidamente, aquilo que seria apenas um momento de ruído, típico dos nova-iorquinos, transforma-se num extasiante tremolo picking, acompanhando por um não menos frenético blast beat de bateria. Sim, de repente,Alighted, a que cabe a tarefa de abrir as hostilidades, deixa de ser uma música de indie rock segundo mandam as regras que os próprios autores de Daydream Nation escreveram na história e passa a ser black metal, com um bom toque de noise para fechar tudo.

Não será este o único exemplo das explorações dos minérios que costumam dar dores de cabeça ao melómano mais preconceituoso – aliás, não é uma variante do que fazem os Chelsea Light Moving, mas antes uma constante neste disco. Lip, pelo seu lado, cresce até a um punk hardcore de fuzz bem grave e carregado, quase a destilar sludge, para em dissonância desembocar novamente numa Escandinávia incendiária, com laivos de inícios de anos 90; Burroughs também não se demora a abraçar um ruído tão punk quanto Melviano, num crescendo ruidoso.

É curioso ver para que lados se mexe Moore nestes tempos sem a sua linguagem principal, que eram os Sonic Youth. E não é menos curioso verificar que o resultado, uma síntese muito própria de frequências mais pesadas, reveladora de que a música do norte-americano não se tem estagnado em fórmulas, respeite todas as formas canônicas para um disco de rock. Chelsea Light Moving não vive de novidade, nem tampouco de originalidade, não cria um significado novo – pelo menos não para toda a gente. Surge como uma ponte que junta duas margens nada distantes, a do belo e a do pesado, e fá-lo sem descaracterizar os antecedentes do mentor do projecto.

Em última instância, é obvio que não é a idade que vai travar a vontade de explorar de Moore e das pessoas por quem sempre se fez rodear. Pode estar em plena crise de meia idade e não serão poucos os fãs a perguntar “para onde raio está ele a ir?”, mas tomara que todas as crises de meia idade tivessem a sobriedade para não caírem nos lugares comuns da falta de qualidade e da repetição de argumentos. Já nem todos têm estofo para fazer um álbum de indie rock que não encaixe na etiqueta. Os Chelsea Light Moving têm, ainda. Resta saber se a idade vai pesar mais aos fãs dos Sonic Youth do que ao próprio Thurston Moore.