1555: era publicado em França o livro “As Profecias”. Nele, o seu autor previa uma série de eventos inevitáveis e catastróficos que iriam aumentar a entropia e o caos no planeta. A sucessão destes eventos, dizia, iria (irá?) culminar no fim do mundo. Sem qualquer tipo de subtileza, ou eufemismos, Nostradamus anunciava o fim da existência.
2003: surgiam ecos sonoros do apocalipse oriundos de Glasgow, Escócia. A palavra já não é escrita, mas sim vociferada e vem acompanhada de uma total falta de subtileza e sensibilidade. Os Black Sun, acreditando ou não em Nostradamus, criavam uma densidade sonora que fazia difícil não acreditar que estamos perante o som de um mundo à beira do fim. Começou com Fleshmarket, repercutiu-se em mais três momentos e tem agora outro ponto alto: Twilight of the Gods, um título que parece anunciar a morte da crença, do espírito, do homem.
A total falta de subtileza e sensibilidade confirma-se logo a abrir, com Code Black. As palavras de Russel McEwan e Kevin Hare, num misto de grito com uivo envolvidas pela bateria agressiva e as densas e pesadas guitarras, são um autêntico soco no estômago. Percebe-se que todo o disco vai ser uma viagem carregada de porrada sonora. A agressividade volta a ser confirmada em Crawling Saviour, o terceiro tema, que se desenrola com sustento nas vozes (uivos?), totalmente sufocadas pela parede sonora que parece desabar em cima de nós.
Os primeiros e raros minutos de misericórdia dados pelo trio apocalíptico surgem nos pontos melódicos que aparecem no final de Gethsemane, pontuado pelas vozes, sempre as vozes. Faz por isso todo o sentido que Eugene Robinson (vocalista dos Oxbow) seja chamado para este princípio do fim em Tabula Rasa e Baby Don’t Cry. A aura de caos é exponenciada com os uivos de Eugene, deixando um sentimento de desespero propício ao ambiente que os Black Sun pretendem instalar.
Transcending of the Mire surge como uma espécie de limbo, que nos deixa respirar. Os primeiros minutos fazem-nos lembrar o apocalipse psicadélico dos Swans de Gira, elevados pelo feedback e o trabalho de guitarra. Baby Don’t Cry, com a sua cadência de uma placa tectónica a desabar, traz de volta o sufoco, a claustrofobia. As vozes continuam a marcar o ritmo, como pregões do fim dos tempos. O cansaço (psicológico) instala-se por fim.
Todo o disco é prenúncio de um fim: físico e espiritual. E assim se contempla o mundo a acabar. Nada interessa, só escapar. Entre várias tareias em que nem a súplica nos vale, no final só resta o vazio.