Na quinta-feira que passou, Blac Koyote enfretou duplo desafio em palco, na apresentação do seu longa-duração de estreia. Não era só o mau tempo, com chuva torrencial em pleno Porto, que dificultava a chegada de audiência ao cinema Passos Manuel, onde deveria actuar; mais perto da Ribeira, no Mercado Ferreira Borges, os PAUS apresentavam ao público da Invicta o seu álbum homónimo, seguido com muito hype. Mas isso não dificultou a tarefa de José Alberto Gomes, cérebro da nova aposta da PAD, que se fez acompanhar muito bem e actuou para uma audiência bastante preenchida fazendo o que melhor sabe: música, da boa.
Costumo dizer que o pós-rock é mais uma escola melódica do que um tipo de música. O fascínio pelas músicas instrumentais é uma libertação da melodia de estruturas fáceis e repetitivas, o que lhe permite afirmar-se e embevecer. Parece-me certo que a proposta electrónica de Blac Koyote não tem nada de rock e provavelmente também não precisa de um pós para acusar experimentalismo, mas há uma convergência natural que a torna inteligível e deliciosa para os leigos na arte sónica computadorizada em que o músico portuense se move.
Não era, ainda assim, apenas a música que fazia deste um concerto especial: havia cinco convidados, quatro dos quais em palco, outra, Maria Mónica, a dar as imagens de que o concerto necessitava. Uma actuação que à partida estava votada à simplicidade de um único performer a tratar todas as texturas diplomaticamente, com o propósito de chegar à música, foi exponencialmente elevada para o estatuto de concerto – e aqui, sim, quase-rock.
Bateria, guitarra, percussão, sintetizadores, além das mãos do timoneiro Gomes, proporcionaram uma experiência sensorial rica, que faz jus ao álbum homónimo de Blac Koyote, mas não se coloca à sua sombra. Esta actuação deixou bem claro que a música deste portuense é desdobrável em géneros mais jazzísticos, com a ajuda da bateria e da percussão, ambientais, graças à percussão e à dose extra de sintetizadores, e até psicadélicos, com a ajuda de uma guitarra utilizada com a dose química de precisão. Curiosamente, tudo isto pode ser concentrado em Lula, que começa com os seus sons de brincar calmamente, até se redimensionar numa lentidão cheia de camadas e de pormenores. Já dizia o meu pai, uma boa música tem de continuar a ser boa quando colocada noutro contexto.
A abrir esteve outro projecto da PAD, The Astroboy, que actuou sozinho perante um Passos Manuel ainda a preencher-se. Um projecto electrónico a que se subtraiu as típicas batidas, colocando-o num local de densidade superior à da nossa atmosfera. Ainda que esse sentimento de complexidade pudesse deixar alguns mais confusos, não se pode deixar de sublinhar que nem para isso houve desculpas, visto que os vídeos de Maria Mónica, à base de coordenadas, permitiram que o público de Astroboy não levantasse voo prematuramente, em busca dos ambientes celestiais de Blac Koyote.