O mundo está a mudar, disso não há dúvida. Falta perceber se para pior ou para melhor: com a troika, a intensificação do autoritarismo e do austeritarismo, com relatos de violência policial a aumentar quase todas as semanas, criminalizando ideias sem qualquer pudor, os próximos tempos não se adivinham fáceis. Mas a História não acaba aqui e o último a rir costuma ser aquele que ri melhor. A estreia de Anti-Flag em Portugal não podia por isso vir em melhor altura. Se ainda houvesse dúvidas, poucas pessoas devem ter saído dali sem conhecer de que lado estão os nossos inimigos e a quem é que nós devemos dirigir a raiva dos nossos punhos – pelo menos a julgar pelas dezenas de “fuck you” disparados durante a noite contra os mais diversos alvos. MasAnti-flag trouxe muito mais do que uma “lição” sobre a revolta, reavivando da melhor maneira o inconformismo adormecido do punk e apelando ao companheirismo entre os presentes.
Nada disto seria possível sem um grande repertório, cantado em coro, do primeiro ao último segundo, por um público incansável. Desde a explosão do início, a começar logo com The Press Corpse(e em que Chris #2 pôs logo em sentido os seguranças presentes, impedindo-os de incomodar quem estava ali apenas para se divertir e subia ao palco para mergulhar no meio do público), até à penúltima música do encore (e já vão ver porque não até à última), a incontornável Should I Stay or Should I Go? (com os The Clash a serem apresentados como a banda preferida), o circle pit não parou um segundo, apesar do chão, escorregadio, ter provocado mais quedas por minuto do que o melhor ring de patinagem. Pelo meio passaram por “clássicos” como Turncoat, Underground Network, Fuck Police Brutality (com um apelo ao erguer do “dedo do meio” para ajudar a passar a mensagem), Cities Burn ou atéThis is the End (For You My Friend), e visitaram temas do último CD, The People or the Gun (2009), como Sodom, Gomorrah, Washington D.C., The Economy is Suffering… Let it Die e The Gre(a)t Depression.
Sempre comunicativos entre cada música, pediram desculpa pela demora em vir a Portugal e prometeram voltar, elogiaram o público presente e, como não podia deixar de ser, revelaram estar atentos à situação que se vive em Portugal, por culpa dos filhos da puta de sempre e dos problemas que existem em todo o lado, “os ricos a roubar aos pobres”. Depois de 911 for Peace, dedicada a todos os que lutaram contra “uma Guerra ilegal no Iraque, desde Lisboa até Pittsburgh”, os Anti-Flag abandonaram o palco, regressando para o encore motivados por um público que, pouco satisfeito, ficou a gritar “You’ve gotta die, gotta die, gotta die for your government?, die for your country? That’s shit!”. Com Die For Your Government a surgir poucos minutos depois do regresso da banda, o melhor estava reservado para o fim. Pat Thetic, para desespero duns seguranças já de si perdidos por perceberem que só andavam ali a incomodar e que não serviam para nada, pegou na bateria, levou-a para fora do palco e colocou-a bem no meio do público para aí tocar Power to the Peaceful. No fim, ainda sobraram alguns minutos para Chris Head, Chris #2, Justin Sane e Pat Thetic ficarem a conviver, entre abraços e fotografias, com os muitos presentes.
A abrir estiveram os Fitacola, a mostrar com competência porque é que são uma das bandas mais populares do punk nacional. Com um concerto que começou morno, com uma casa ainda a meio gás e um público envergonhado, os Ficacola conseguiram agitar os presentes com a sua entrega e energia, gerando uma empatia crescente e juntando em frente ao palco um grupo cada vez maior, à medida que o concerto avançava, empenhado a gritar cada letra da banda e a deixar cair as primeiras gotas de cerveja num chão ainda limpo.