Olhando para o palco da Aula Magna e o conjunto de instrumentos que estavam dispostos, logo se percebeu que longe vão os tempos do Andrew Bird versão faz tudo em palco. De facto, acompanhado pela banda, só isso mudou. Há mais gente em palco, mas a timidez e uma aparente vergonha continuam a transparecer. Se nos álbuns se vem notando a recorrente versatilidade das suas composições, dos quais os dois lançados este ano – Break it Yourself e Hands of Glory-, são um bom exemplo, do músico de Chicago continua-se a contar com a discrição e uma voz quase sumida quando fala para o público.
Logo no primeiro tema, Hole In the Ocean Floor, ainda sozinho em palco, colocou presente todas as características pelas quais ficou conhecido. Violino, com as camadas que utiliza de sobreposição das notas do mesmo, assobios e a sua voz envolvente. De facto, entendeu-se o porquê de o americano afirmar que muita gente o aborda e lhe conta que foi o impulsionador para a aprendizagem do violino. Assim, a forma como toca, contornou os formatos mais clássicos e deu uma dimensão mais actual e jovial ao instrumento, mesmo quando o utiliza para assobiar para o seu interior como emWhy do longínquo The Swimming Hour.
Durante a maior parte dos temas, o seu cantar é acompanhado por constantes gestos e abanar da cabeça, chegando a parecer que é naquele momento que a composição toma corpo, aprovando ou desaprovando as possíveis incorrecções e incoerências. E quando ao terceiro tema, A Nervous Tic Motion of the Head to the Left, a sua banda entrou em palco, sentiu-se que de imperfeições as suas criações não sofrem, e que seria uma tentação legitima pedir que nunca pare de assobiar.
Recorrendo a tantas e diversas influências, jogou-se entre o blues, o jazz, o country e maioritariamente o folk de influência americana. Mas desengane-se quem poderia ter vindo à procura de uma execução igual e rígida daquilo que se ouve em todos os discos. Na grande parte das faixas, notou-se um incremento e mudança de ritmo, ganhando novas temáticas não presentes nos álbuns, como foi facilmente verificável em Don´t Be Scared ou Desperation Breeds.
Depois de Lusitania e Orpheu, Andrew Bird abandonou, como o próprio admitiu, as componentes mais eléctricas do instrumental, e, com a sua banda transformada num quarteto de jazz contemporâneo, com viola acústica, contrabaixo e violino, interpretou músicas como When That Helicopters Comes, Sovay eMX Missiles, indo à base da sua estrutura num registo praticamente acústico e muito dependente da voz. Neste momento, o palco pareceu enorme para uma banda que actuava no limiar do mesmo, extremamente próximos e a lembrar um conjunto a tocar num bar pegajoso e pouco espaçoso.
Antes de sair para o recorrente encore, Fatal Shore, Eyeoneye eTables and Chairs, foram de encontro às expectativas dos presentes que se mantiveram respeitosos e calados durante toda a actuação. Mas a noite não poderia acabar sem a música que realmente o consagrou, e Fake Palyndromes foi o mote para o terminar de um concerto extenso com a interpretação de um rol de mais de uma dezena de músicas em mais de duas horas.
Se as linhas do seu arco se iam desfiando à medida das suas incursões pelo violino, Andrew Bird tomou o sentido contrário. Nunca descarrilou e ofereceu um concerto íntegro, comovente e calmante. Se o seu casamento estará para sempre ligado a Portugal, também o público português parece querer ficar para sempre ligado a ele pela forma como encheu a Aula Magna.