“Sôl austan, Mâni vestan”, lançado em 2013, pode ser entendido como um ponto de viragem para Burzum. Não que Varg Vikernesnunca tivesse escapado às convenções do black metal – muito antes dos álbuns ambientais gravados na prisão, até mesmo o álbum de estreia, em 1992, possuía faixas como “Channeling The Power Of Souls”, “The Crying Orc” e “Dungeons Of Darkness”, onde estava patente o interesse por dark ambient, folk, e drone, respectivamente. Se a decisão de enveredar por tais sonoridades em Burzum viria a influenciar toda a história do black metal, as mudanças no álbum do ano passado manifestam-se mais a um nível pessoal: foi o seu terceiro álbum ambiental, mas o primeiro a ser gravado em liberdade. Significa isso que a ausência de elementos metal foi totalmente deliberada, ao passo que “Dauði Baldrs” e “Hliðskjálf” foram gravados com os poucos instrumentos a que lhe permitiram acesso na prisão.
Tal como praticamente tudo o que veio após “Filosofem”, “Sôl austan, Mâni vestan” dividiu opiniões, mas é um álbum que cresce com múltiplas audições. Com uma ausência quase total de instrumentos familiares, os sintetizadores dominam despudoradamente a paisagem sonora, não procurando recriar timbres orquestrais. Esse provou-se um meio bastante adequado para esta faceta de Burzum, não sendo já necessário o lo-fi de outrora para criar um determinado distanciamento: é a própria estrutura das músicas, num agradável balanço entre desenvolvimento musical e estatismo, que permite criar um espírito de niilismo pacífico. Com um som mais cristalino, Varg serve-se mais de graves simultaneamente melódicos e percussivos de um modo que funciona extremamente bem em faixas como “Rûnar munt þû finna” ou “Ganga at sôlu”. De entre as músicas onde eles não figuram, talvez se possa destacar “Sôlbjörg”, com um belo e paulatino solo que termina o álbum num registo bastante positivo.
Tudo isto causava um entusiasmo cauteloso no que a “The Ways Of Yore” dizia respeito. Mais um álbum ambiental com influências neopagãs, o título apresenta de imediato a intenção de regressar ao passado, ao cenário idílico que Varg constrói da Europa anterior ao cristianismo. O problema reside na execução: este é, muito possivelmente, o pior álbum de sempre de Burzum.
Vamos por partes, pois cada música parece ter algum defeito que eclipsa as suas qualidades. A repetição em “God From The Machine” podia ser justificada pelo facto de ser uma introdução, mas a faixa seguinte, também ela curta, é estilisticamente semelhante. A heterofonia presente nessa poderia torná-la mais entusiasmante, não fosse o timbre irritante da linha mais ornamentada e a dissipação gradual do interesse da linha fundamental com cada nova repetição. “Heill Odinn”, a terceira faixa, introduz a voz de Varg pela primeira vez desde “Umskiptar”, de 2012, mas é cantada de forma tão cómica que é difícil levá-la a sério. As três músicas seguintes poderiam ter saído de “Sôl austan”, mas o sintetizador demasiado metálico na primeira é algo intrusivo e as duas seguintes, para além de demasiado longas, possuem narrações em inglês que não acrescentam muito musicalmente (e, por algum motivo, parece que Varg decidiu desenvolver problemas de fala em “The Coming Of Ettins”). Este conjunto é seguido de “Heil Freyja”, uma versão alternativa, com vozes, de “God From The Machine”. Com prestações vocais muito aquém do aceitável nas faixas seguintes, pouco há a dizer sobre elas.
Sem misericórdia pelo ouvinte, as duas composições com duração superior a 10 minutos são deixadas para o final do álbum. Não fossem os 50 minutos anteriores, talvez estivéssemos mais receptivos a “Emptiness”, que consegue unir a sonoridade do álbum do ano passado com a da “Tomhet” que encerra o “Hvis Lyset Tar Oss”, e a “To Hel and Back Again”, que faz o mesmo com a “Rundtgåing…”, de “Filosofem”, mas por esta altura já passámos o ponto de saturação. Saltar directamente para elas poderá ser a melhor forma de aproveitar este álbum.
Ao passo que artistas como Gaahl e Fenriz repartem a sua criatividade por diversas bandas, Varg e Burzum são sinónimos. O ouvinte mais apto a ler “The Ways Of Yore” como uma obra-prima será o seguidor incondicional de tudo o que Varg Vikernes faz ou diz. Mas, nesse caso, a adoração de um álbum de um assassino racista neopagão não será o mais preocupante.