Correram-se as cortinas do Alive de 2013 com algumas cortinas e outras novidades. Soube-se, em primeira mão, que em 2014 haverá mais festa no Passeio Marítimo de Algés, entre os dias 11 e 13 de Julho. E enquanto falta para isso, encerre-se o capítulo deste ano:
Linda Martini
Os Linda Martini não jogam, definitivamente, no campeonato das surpresas. Ao longo de quase uma década de carreira, construíram uma sonoridade própria e recolheram uma popularidade que, goste-se ou não, é correspondida com qualidade. Enquanto Turbo Lento não impregna os alinhamentos dos seus concertos, o quarteto de Queluz limitou-se a levantar o véu (que já há uns dias não cobria nada do novo álbum) com o novo single Ratos, naquilo que foi o declive óbvio e único da sua actuação – uma música que parece não tirar todo o sumo que o baterista Hélio Morais tem para espremer, e que acabou por jorrar em todas as outras malhas, pejadas dos clichés líricos da pop, que se esbatem na fórmula guitarras post-rock com ruído muito punk da banda. A fechar, a sempre sonante 100 Metros Sereia, a puxar pelo sing-along da pequena multidão, que demonstrou ter feito bem o trabalho de casa.
Jake Bugg
Certinho, Jake Bugg não exterioriza ponta de desalinho. Fiel à matriz Dylan-esque, o britânico de dezanove tenros anos passeou mornamente a sua folk por Algés e o Alive reconheceu-lhe talento quanto baste. Não abisma, não horripila e, se à partida ansiássemos por alguma rebeldia adolescente, depressa nos desiludiríamos – ela não existiu. Recorrendo aos temas do seu primeiro álbum de estúdio, homonimamente intitulado, Bugg não despenteou o seu corte tipicamente britânico e encheu a sua estreia em Portugal de tons acusticamente neutros e chatinhos.
Of Monsters and Men
Mãe de fenómenos alternativos, a Islândia mimoseou o planeta com o post-rock ídilico dos Sigur Rós e a volúvel electrónica de Björk. O último capítulo do nórdico ilhéu está agora ser dactilografado pelos Of Monsters and Men – bastaria olhar para a enchente no palco secundário para reconhecer a recente e inesperada magnitude dos islandeses. Por entre subtis batalhas para confiscar o melhor ângulo de visão, o público lá se concentrou na afectuosa indie folk brotada em palco por sete almas e depressa cantarolou as malhinhas felizes de My Head Is Animal – até agora, o único disco publicado pelos OMaM. À imagem de Edward Sharpe and The Magnetic Zeros (há até quem diga que a malta Keflavik “rouba” os tipos de Los Angeles), aplicam na simpatia e no jogo de vozes masculino-feminino os maiores trunfos, conquistando pelo seu “appeal” familiar, tão em voga nos tempos últimos. Little Talks, no fim, e Mountain Sound, no início, foram perseguidas a cada sílaba pelos portugueses – comunhão magnânima, que levou para outro nível as não-tão-sublimes-assim composições dos Of Monsters and Men.
Tame Impala
A banda de Kevin Parker era, sem dúvida, uma das que mais expectativas gerava no festival. Depois de uma passagem pelo palco secundário do Super Bock Super Rock de 2011 a ser alvo de críticas pelo incapacidade de fazer jus às malhas todas Revolver dos Beatles dos Tame Impala, os Australianos tinham em mãos a tarefa de provar que Lonerism não era apenas um onanismo deParker no estúdio. O início tresandou à banda de Liverpool, numa sequência que atingiu o pico no single It Feels Like We Only Go Backwards, sendo que a sonoridade da banda acabaria por se dirigir a um rock mais desértico, à medida que os reverbs da guitarra iam dando lugar ao fuzz. Soou a Sleepy Sun, sem deixar de ter um cheiro de Lennon a ser acompanhado pelo groove desprezivelmente agradável do baixo de McCartney — e se pomos as coisas assim, temos de admitir que, de “não se percebeu bem se eram bons” a “são uma boa banda” é um passo claro em frente dado por uns Tame Impala seguros de como se apresentar num palco. It feels like they go onwards, sem, contudo, tirar os pés do pedal do revivalismo.
Blaya
A energia de Blaya tornou-se evidente pelo canal de festa que são os Buraka Som Sistema. O frenético e o exótico encontraram-se no eixo Lisboa-Luanda para destacar um elemento novo, o do erótico, esse, sim, encarnado na perfeição pela dançarina-feita-cantora que agora se estreia a solo. Ainda sem planos de promoção anunciados para os próximos tempos, Blaya fez valer o seu EP de estreia a solo com a sua voz como ponto fulcral, numa actuação que se pôde resumir a um DJ e a duas dançarinas como sidekicks. Fugindo à catadupa contagiante e pró-twerk que faz dos Buraka uma banda inconfundível, o palco clubbing viu a sua cara mais mediática a esticar a corda do negro do soul ao rap, sem deixar a electrónica de parte, sempre com a tónica na dança – ora, pois claro. Do palco ao público, esbateram-se as barreiras entre performers e assistência. Todos dançaram.
Twin Shadow
A radiofónica pop resgatada dos berrantes 80s, perpetrada porGeorge Lewis Jr., não convence em disco e não instiga ao vivo. Irrevogável – sim, irrevogável – romântico, o norte-americano distrai pela sua franca comunicação enquanto se satisfaz o estômago nas mesas circundantes, mas jamais ultrapassa o patamar do “espirituoso”. Five Seconds, single reavido do discoConfess, lá agita a turbe que deixou o jantar para mais tarde, mas todas as outras retro-beats de Twin Shadow são demasiado insonsas para deixar o secundário entregue à arritmia.
Phoenix
«Já ouvimos isto em qualquer lado, vezes sem conta.», dissemos nós sobre os Two Door Cinema Club, há duas noites. Os Phoenix são exactamente outro dos casos em que a indie para abanar a ossatura, referta de bordaduras synthpop, estimulou quem visitou o alcatrão do Parque Marítimo de Algés. Talvez até mais do que inicialmente se esperaria: nunca os franceses usurparam os tops, rádios ou até mesmo as franjas do mainstream português. Regressados aos longa-duração com Bankrupt!, os homens de Versalhes superiorizam-se aos norte-irlandeses pela maior pujança – ah!, grande baterista que é o Thomas Hedlund, membro dos Cult of Luna – e descortinaram o motivo de serem um nome mais do que estabelecido por essa Europa e Estados Unidos fora. Abrindo e fechando com a novinha Entertainment, os Phoenixdespejaram sessenta minutos de vibrações pop, cheias de luz, clínica receita para garantir um dos melhores concertos do terceiro dia. Trying To Be Cool é malhona e os regalos de Wolfgang Amadeus Phoenix, como Armistice, fizeram de Thomas Mars e sus muchachos uns bons triunfantes.
Alt-J
Mal passou um ano desde que os Alt-J se estrearam em Portugal, mas o seu crescimento meteórico ultrapassou as previsões estratosféricas para um nível de espaço sideral. Eram os mesmos miúdos de An Awesome Wave, com um alinhamento semelhante, com a mesma entrega e com a mesma competência em palco, mas as suas músicas, de uma intimidade sexual, viram-se prejudicadas por uma orgia de fãs sedentas de fome de refrões orelhudos, como se, no fundo, não fossemos ouvir Matilda mas sim uma I Want It That Way dos Backstreet Boys. Tanto quanto sabemos, eram eles que estavam em palco a flirtar com o público que ensurdecia o sistema de som do palco secundário. Ficou claro que, ainda que intocáveis na execução e mesmo com a tónica num baterista que tem no engenho o segredo para uma sonoridade inconfundível, cheia de soul, os britânicos pedem o silêncio de uma sala fechada, a intimidade de um tecto assente em estruturas sólidas para nos despertar o desejo lascivo de praticar o coito com o próximo da forma que sentimos há uns meses atrás. Todos sabemos que sussurrar é um acto extremamente mais sensual que gritar as tripas.
Kings of Leon
Coube aos Kings of Leon encerrar o estrado principal do Optimus Alive. Uma tarefa que se revelaria difícil para uma banda de questionável qualidade (sim, é o caso), não fosse esta viver de uma popularidade imensurável (também é o caso). Assim, à medida que, sem surpresas, nem pormenores dignos da nossa atenção, os norte-americanos foram despejando singles, o feedback chegava na forma de euforia e de êxtase. Infelizmente, foram poucos os singles conhecidos e a prestação dos Kings of Leon mal chegou a morna. Enquanto o frio fustigava a audiência, atingia-se o clímax com Sex on Fire, ou assim se esperava, se a música merecesse a nota de destaque; foi, no entanto, a mais entoada, com direito a um dos uníssonos mais ensurdecedores do festival. A pop tem destas coisas.
Band of Horses
Enquanto, no palco principal, tudo aguardava por Sex On Fire com uma bizarra ânsia, os Band of Horses pousaram a trouxa e montaram a sua oficina americana. Nascidos a norte, em Seattle, não escondem as ingerências sulistas, de barbas densas e prados extensos – está longe de ser coincidência que a Carolina do Sul seja agora o seu Estado de residência, exactamente o mesmo de Sam Beam, senhor Iron & Wine. Aninhados numa discografia de quatro discos – o último dos quais, Mirage Rock, não fascinou – lá sofreram por um público que, já após a meia-noite, desejava palpitações de outro rubor. Descaradamente ternos, amolecidos por um lirismo tão querido no SXSW, os Band of Horses foram plácidos em demasiada para um Alive balançado entre vácuo radiofónico dos Kings of Leon e o hype desmesurado dos Django Django. Por entre os polos, The Funeral foi bonita.
White Haus
White Haus é João Vieira, conhecido como DJ Kitten ou como homem-voz-e-guitarra dos X-Wife. A solo, é house em forma de alegria, a gritar a disco sempre com o toque sujo do punk. Para este concerto, com um dançarino a desviar atenções com um toque performativo, o músico portuense fez-se acompanhar de mais um manuseador de parafernália sonora (vulgo sintetizadores e outros que tais) e de um baterista, que garantiram a orgânica da actuação e a força para não depender das frequências graves para induzir em dança e festa os que pelo palco Clubbing ficaram. Ficou visto que o EP homónimo e de estreia tem tudo o que é necessário para atingir o objectivo a que se propõe. Venham o novo álbum e mais concertos.
Django Django
Pelas mãos de Tarantino e do seu último filme, ficámos a saber da importância que Django tem no imaginário de África. Um deus lutador, um rio que não pára de correr e um exemplo de perseverança. Eram, de resto, as características necessárias para aguentar um domingo a quedar-se para segunda-feira sem cair de cansaço, depois de três dias de festa, mas os Django, que ousam dobrar as intenções com uma dobradinha do nome, fizeram valer o seu rock de electrónicas esquizofrénicas e toques exóticos. Em palco, os britânicos exalam umas nuances mais africanas, onde se esbatem as evidências electro-ruidosas de quem ouve demasiado Animal Collective. Fizeram valer a hora já demasiado avançada.